São Paulo, sábado, 25 de junho de 2005

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LIVROS

POLÍTICA

"Memórias da Segunda Guerra Mundial", uma das obras mais conhecidas do ex-premiê britânico, é reeditado

Biografia é o melhor da literatura de Churchill

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
ESPECIAL PARA FOLHA

Winston Churchill, o líder britânico durante a Segunda Guerra, foi um dos mais extraordinários estadistas do século 20. Muitos o consideram o principal responsável pela derrota do nazi-fascismo. Ele também foi um grande jornalista e escritor, que produziu 43 livros, a maioria de história, mas também de poemas, filosofia, política e diversas biografias. Em 1953, ganhou o Prêmio Nobel de Literatura.
Apesar de ter sido parlamentar por cinco décadas, ocupado diversos cargos de primeiro escalão na administração pública britânica (inclusive os equivalentes aos de ministros da Fazenda e da Marinha) e chefiado o governo duas vezes, era um homem que precisava trabalhar para ganhar seu sustento. E seu trabalho era escrever, o que fazia magnificamente bem.
Seus melhores momentos como escritor foram como memorialista. Por exemplo, "Minha Mocidade" (que no Brasil foi inicialmente traduzido por Carlos Lacerda, outro político de primeira grandeza que tinha de escrever e traduzir prolificamente para sobreviver) é um livro notável, em que, ao relembrar incidentes dos primeiros 25 dos 90 anos que viveu, analisa com verve e erudição o fim da era vitoriana nas escolas, na metrópole e nas colônias.
O ponto mais alto de seu trabalho literário, no entanto, talvez tenham sido as "Memórias da Segunda Guerra Mundial", que a Nova Fronteira reedita agora, por ocasião do sexagésimo aniversário do fim das hostilidades.
Na edição original inglesa, são seis volumes. No Brasil, eles foram condensados para apenas dois. Com certeza, perdeu-se muito. Mas provavelmente o leitor médio brasileiro será capaz de se satisfazer com o resumo.
A obra revela o gosto do autor por detalhes picarescos, raro em autobiografias de políticos, em geral exclusivamente preocupados em talhar bem a sua imagem para a posteridade.
É verdade que, nos anos 1950, o mundo ainda não estava dominado pelo comportamento politicamente correto. Mas não deixa de ser curioso, por exemplo, Churchill relatar que, na primeira noite da guerra, ao se dirigir para o abrigo antiaéreo de sua vizinhança, ele tivesse feito questão de levar consigo apenas apetrechos médicos e uma garrafa de brandy.
É impossível comprovar se tudo o que o autor descreve ocorreu da exata maneira como aparece no livro, inclusive diálogos textuais (como o do convite do rei Jorge 6º para compor um novo governo, em 1940, que teria sido curto e bem-humorado, quase jocoso, apesar da gravidade da situação).
A dúvida tem pouca relevância, já que o registro de Churchill, ainda que eventualmente impreciso, tem por si só indiscutível importância histórica. Além disso, em não poucos trechos, ele transcreve ou se refere a documentos (cartas, memorandos, atas de reunião), o que dá caráter comprobatório a muitas passagens.
Inevitavelmente, a história da Segunda Guerra como contada por Churchill também está contaminada por suas convicções ideológicas, sem dúvida controvertidas. Ele foi um conservador empedernido, capaz de opiniões assustadoras pelos padrões políticos do início do século 21. O sentimento patriótico exacerbado, o anticomunismo veemente, o etnocentrismo indisfarçável estão presentes com freqüência.
Tal viés não empobrece a fascinante exposição de fatos absolutamente fundamentais para a compreensão do mundo contemporâneo, feita com vigor e tensão por um dos seus principais personagens. Um livro indispensável para quem quer conhecer os tempos em que vive.


Carlos Eduardo Lins da Silva é jornalista e diretor de relações institucionais da Patri Relações Governamentais & Políticas Públicas

Memórias da Segunda Guerra Mundial - Vol. 1
    
Autor: Winston Churchill
Tradução: Vera Ribeiro
Editora: Nova Fronteira
Quanto: R$ 49 (560 págs.)


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