São Paulo, sábado, 25 de junho de 2005

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POLICIAL

Thriller é a primeira obra de Karin Alvtegen a ser publicada no Brasil

"A Procurada" traz mistérios da "rainha" do crime sueco

JOAQUIM NOGUEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nos romances de suspense em que o personagem principal, geralmente narrador, é detetive particular, ele costuma perguntar a quem o consulta no escritório: "Por que não procurou a polícia?". O interessado dá uma desculpa qualquer, não gosto de polícia, tenho medo de entrar em cana etc., e com isso o autor joga a investigação no colo do "private eye".
Karin Alvtegen, autora de "A Procurada", resolve o problema de forma mais radical: a polícia da Suécia é ruim, simplesmente. Tão ruim que investigando quatro homicídios violentos não estabelece nem sequer uma afinidade entre as vítimas que pudesse servir de base para a investigação. Tanta ineficiência acaba criando um problema sério para Sibylla, mulher de 32 anos, problemática, confusa, contraditória, com um passado desconexo e sofrido.
Com efeito, como se dizia antigamente, filha única do casal mais rico da cidade, aos 16 anos ela repudiou a família, deu para um mecânico, engravidou, tomou um chifre escandaloso e pungente, perdeu a criança e baixou num hospital psiquiátrico. Dali se evadiu passando a viver a esmo em Estocolmo, dormindo em albergues ou dando chapéu em hotéis, seduzindo homens maduros (e abonados) dos quais filava jantares. Com isso a autora (me pareceu bastante jovem, a julgar pela linguagem, pelas ações e reações da protagonista) tece uma crítica aos valores burgueses, da família à educação, do consumo ao relacionamento social.
Como ela não aprofunda essa crítica, a melhor parte do livro fica sendo a investigação, que os leitores hão de acompanhar ávidos para saber quem diabos matou e estripou tanta gente. A autora se sai bem nessa tarefa. Constrói a trama com habilidade, "escondendo" os crimes, plantando pistas falsas e assim conduz o leitor até o desfecho. Nesse "iter" surge Patrik, garoto de 15 anos, meio desnorteado, como é comum na idade dele, meio expert em computadores, como é próprio da juventude atual, principalmente nas grandes cidades, que vai servir de arrimo a Sibylla e à investigação.
"A Procurada" só não é melhor devido às falhas na concepção e gramática. Seja por inexperiência (eu disse que Karin era jovem? Não. Só imaginei), seja por sofreguidão, o fato é que o livro tem coisas detestáveis tipo "capô do motor", "mancava quando andava", "sentiu o sangue correr nas próprias veias", como tem afirmações de efeito duvidoso: "Contudo, Deus nem sempre é bom".
A tradução brasileira também ajudou. Volta e meia o pronome "lhe" é usado no lugar de "a" ou "o" e toda hora deparamos com o verbo "haver" conjugado no presente em frases que estão no passado. Um dos erros, não sei se atribuo à autora ou à tradução: "Da primeira vez sentou-se no seu colo. Sentiu a pressão das coxas dele sobre as suas..."
Noves foras essas mancadas, dá para ler "A Procurada". Principalmente se você curte o suspense pelo suspense e tem de encarar um fim de semana frio e chuvoso como os dias na Suécia que atormentam a piradinha Sibylla.


Joaquim Nogueira é escritor, autor de "Informações sobre a Vítima" e "Vida Pregressa", ambos publicados pela Companhia das Letras

A Procurada
  
Autor: Karin Alvtegen
Tradução: Monica Goldschmidt
Editora: Record
Quanto: R$ 39,90 (352 págs.)


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