São Paulo, sábado, 25 de junho de 2005

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CINEMA

Diretor da Warner no Brasil afirma que queda de público é "reacomodação" e que o DVD não ameaça a sala escura

Executivo nega crise e "morte" das salas

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

As bilheterias de cinema estão em queda aqui e nos EUA. Mas José Carlos Oliveira, diretor da Warner no Brasil, está sorrindo -e não é à toa.
São da Warner o campeão de bilheteria do ano (até agora), "Constantine", com 2,5 milhões de espectadores, e o líder do último fim de semana, "Batman Begins", visto por 475 mil pessoas.
Ao contrário da maioria dos observadores do mercado cinematográfico, que estão assustados com o comportamento do público neste ano, Oliveira acha que não há crise.
"Crise, só se for de oferta", diz. Ele afirma que a análise do quadro não deve se concentrar apenas nos números. Se os títulos forem avaliados, diz o distribuidor, a conclusão será que os filmes da temporada atual estão menos atrativos do que os de anos anteriores -os da Warner incluídos.
Sobre o mais recente debate do cinema brasileiro, a disputa entre a concentração e a pulverização de recursos estatais para a produção, Oliveira é categórico: "A discussão está esquizofrênica".
A seguir, trechos de sua entrevista à Folha.

 

Folha - O sucesso de "Batman Begins", quando as bilheterias estão em queda, confirma a tese de que o público está sendo atraído ao cinema apenas por filmes-evento e aguardando para ver os demais títulos em DVD?
José Carlos Oliveira -
O grande problema da nossa indústria, em qualquer parte do mundo, é que não nos pautamos muito de pesquisas que nos permitam chegar a essas conclusões. Vivemos da percepção de algumas coisas. Se as pessoas fazem pesquisa, elas escondem muito bem os resultados.
Minha teoria sobre a queda [de bilheteria] é que a indústria está num momento de parar para pensar qual é a estratégia dos anos futuros, principalmente porque se acena com uma quebra de paradigma tecnológico importante, que é o cinema digital.
O investimento de produção de filmes [nos EUA] cresceu muito nos últimos anos. Como todas as empresas são de capital aberto, têm seus acionistas e conselheiros, acho que eles começaram a fazer a conta: "Será que esses US$ 20 milhões a mais que estou gastando vão me dar o resultado esperado lá na frente?".
O que está havendo é uma reacomodação. O que dirige a nossa indústria são os produtos. Se colocarmos frente a frente os filmes oferecidos no mesmo período do ano passado, perceberemos que neste ano já estamos em déficit em número e potência de títulos.
Começamos [a Warner] 2004 com "O Senhor dos Anéis" e "O Último Samurai", tivemos uma grande surpresa com "Alguém Tem que Ceder", e a maior de todas com "A Paixão de Cristo", que fez 6,5 milhões de espectadores no Brasil.

Folha - O que explica a queda específica do filme nacional?
Oliveira -
Falando do caso brasileiro, não gosto de chamar de crise. Mas, se for uma crise, é uma crise de oferta. Está faltando um produto nacional potente, que faça a diferença.
Até este período, em 2003, "Carandiru" já havia feito 4,4 milhões de ingressos e "Deus É Brasileiro" já havia feito 1,7 milhões. [Ambos os títulos são da Columbia.]
No ano passado, neste mesmo período tínhamos dois filmes nacionais no ranking dos dez mais vistos -"Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida" [Warner] e "Sexo, Amor e Traição" [Fox].
Neste ano, ainda não tivemos nenhum [brasileiro entre os dez mais vistos].

Folha - O DVD vai matar a sala escura?
Oliveira -
Fizemos uma pesquisa com o público de todos os filmes que lançamos nos cinemas. Constatamos que o grande consumidor de DVD é o grande usuário de cinema.
Os maiores títulos em bilheteria da Warner Bros nos últimos anos são também os maiores itens de venda de DVD, como "Matrix", "O Senhor dos Anéis", "Harry Potter" e "Tróia".
Acreditamos que o Brasil tenha uma base de 18 milhões de pessoas que vão de seis a sete vezes por ano ao cinema. Esta base também consome os filmes em DVD.
Desde 97 [ano da introdução do formato multiplex no Brasil] o hábito de consumo do freqüentador de cinema está mudando. Ele vai mais vezes ao cinema.

Folha - Como o sr. avalia o debate pulverização x concentração, a respeito da distribuição de recursos estatais para a produção de filmes no Brasil?
Oliveira -
Estamos num ponto em que não estamos maduros o suficiente para dar um salto e virar Bollywood [a indústria indiana] ou Hollywood, nem temos coragem e recursos suficientes para reservar uma parte dos fundos de desenvolvimento do cinema brasileiro a filmes que sabemos que não vão ter resultado comercial.
A discussão fica esquizofrênica, porque colocamos todos esses filmes no mesmo bolo, e todos mamando na mesma teta.
Está no momento de parar e falar: quem quer fazer cinema industrial joga do lado de cá do campo. Quem quer fazer cinema autoral, experimental, de temática regional pula para o lado de lá. E vamos jogar jogos diferentes.

Folha - Quem vai ser o juiz?
Oliveira -
Sempre achei que cinema industrial tem que estar debaixo do guarda-chuva do Ministério da Indústria e Comércio, e cinema de autor conversa com o Ministério da Cultura.


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