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LITERATURA
Leitores da 11ª Jornada Nacional de Literatura, que ocorre em cidade gaúcha, "preparam-se" para o evento
Passo Fundo aproxima escritor e público
JULIÁN FUKS
ENVIADO ESPECIAL A PASSO FUNDO
Milhares de pessoas se engalfinham, apertadas, numa tenda de
circo improvisada, olhos sequiosos aguardando a chegada de alguns escritores. Antes deles, no
entanto, um espetáculo de cores
vai revelando malabaristas, dançarinos, bonecos gigantes, homens com pernas de pau. Do alto,
pomposamente, desce por uma
corda o cantor que entoa o hino
da 11ª Jornada Nacional de Literatura, um hino direto, ausente de
qualquer floreio literário.
A literatura pode esperar, diante
da exuberância circense que diverte os espectadores. Pode esperar, sim, também porque lhe tomará emprestada a exuberância,
porque também será espetáculo.
Em Passo Fundo (RS), onde se
realiza desde segunda-feira a jornada, valem os interesses dos leitores. São as vontades do público,
formado principalmente por professores e estudantes, que têm de
ser atendidas.
E esse público, que já há meses,
durante a chamada pré-jornada,
veio lendo e estudando as obras
dos autores, agora quer é festa, conhecê-los de perto, abraçá-los, comentar suas obras. E que a conversa literária surja assim, nesse
interstício entre o autor e sua obra
ou entre o leitor e seus gostos.
Nesse sistema, ainda que a preocupação maior seja com o público, tampouco os autores saem insatisfeitos.
"Aqui há uma proximidade
maior entre o público e o escritor.
Não existe aquele muro, aquela
parede de vidro que há em outros
lugares, nas bienais, aquele fosso
que os distancia. A começar pelo
espaço, as lonas de circo são uma
grande sacada", diz Nelson de
Oliveira, um dos 110 autores convidados para o conjunto dos
eventos, que inclui a 3ª Jornadinha, voltada para o público infanto-juvenil, e o 1º Seminário Nacional de Jornalismo Cultural, entre
outros.
Mesmo aqueles que, em outras
circunstâncias, poderiam ser considerados guardiões da formalidade, parecem concordar.
"Sinto em Passo Fundo uma
coisa menos comercial do que se
vê nas grandes bienais, que estão
preocupadas em fazer com que
um determinado escritor, de uma
determinada editora, venda o máximo. São feiras para escritores
best-sellers", diz o poeta Ivan Junqueira, presidente da ABL (Academia Brasileira de Letras), entidade que realiza em Passo Fundo
a primeira reunião da história fora de sua sede no Rio de Janeiro.
O ensaísta Sérgio Paulo Rouanet, também da ABL, compartilha
da visão de Junqueira. "O importante é que passa a idéia de que ler
é divertido. Se você começar a
moralizar, dizer que se tem de ler
para virar bom cidadão, para virar bom filho, ninguém se sentirá
seduzido", afirma, destacando o
trabalho de estímulo à leitura realizado pela Jornadinha.
Um evento literário perfeito,
nos moldes que se esperaria em
qualquer lugar do mundo? Definitivamente, não. O que parece
imperar em Passo Fundo, pelo
contrário, é uma tolerância à imperfeição, tolerância em relação
aos inevitáveis percalços, às numerosas falhas de organização.
O escritor Daniel Munduruku,
por exemplo, indígena da tribo
munduruku, pouco se incomodou com o fato de seu primeiro
dia de participação na Jornadinha
ter sido cancelado por uma forte
ventania que ameaçava as frágeis
tendas. Em vez disso, sentou-se a
conversar com algumas crianças
que o reconheceram e, tendo lido
seus livros, puseram-se a comentar cada uma de suas histórias.
O jornalista Julián Fuks viaja a convite
da organização da 11ª Jornada Nacional
de Literatura de Passo Fundo
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