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Estopim é límpido como um lago
da Reportagem Local
Este "Estopim" chega já candidato a melhor trabalho solo de Ná
Ozzetti. Nunca antes ela reuniu
com tanta harmonia qualidades
de interpretação, autoria e co-autoria, produção e arranjos. Na relação entre tais quesitos, "Estopim" é uma pequena sinfonia.
Tudo caminha no compasso. Os
arranjos de Dante Ozzetti, às vezes oscilantes, estão aqui concisos
e elegantes. Ná canta segura como
nunca, como quem passeia no
bosque. As composições, do núcleo de letristas esmerados formado por Itamar Assumpção, José
Miguel Wisnik e Luiz Tatit, formam um conjunto compacto,
coerente.
Há alguns pontos de destaque,
claro. "Capitu", de Tatit, faz o elogio da personagem de Machado
de Assis ("poderosa ponto com
ponto br"), e seu creme cai como
luva nas mãos de Ná.
A parceria com Itamar Assumpção "Canto em Qualquer
Canto" (além de tudo dona de arranjo tocante, meio de banzo
afro-português) oferece mais um
pouco da já conhecida e carnuda
poesia do letrista: "Tem gente que
pira e berra/ Eu já canto, pio e silvo/ Se fosse minha essa rua/ O pé
de ipê tava vivo". Bonito de doer.
"Desfile", de Ná e Tatit, elabora
um ritual tristonho em tempo de
samba; "Crápula", de Dante e Tatit, abusa dos jogos fonéticos, sem
cair no "cabecismo" (e isso é raro
entre os "vanguardeiros" concretos de São Paulo).
"Princesa Encantada", de Cacique e Antonio Correia (e única de
fora do círculo central de autores), fecha o disco num duo caipira zombeteiro, com o contracanto
sempre potente de Suzana Salles.
Bem, nada disso vai ao rádio
nem à TV. Dados os escombros
que se vêem diariamente nas hebes e faustos, talvez seja razão para comemoração. "Estopim",
tranquilo e límpido como um lago, certamente é.
(PAS)
Avaliação:
Disco: Estopim
Artista: Ná Ozzetti
Lançamento: Ná Records
Quanto: R$ 18, em média
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