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CINEMA - ESTRÉIAS
Tensão domina novo filme de Beto Brant
MARCELO RUBENS PAIVA
especial para a Folha
Estréia hoje, em São Paulo,
"Ação entre Amigos", o novo filme
de Beto Brant. É a história de quatro amigos, ex-guerrilheiros presos depois de um assalto a banco,
no período do regime militar, que,
numa pescaria, 25 anos depois,
reencontram seu algoz, o chefe dos
torturadores. Prepare-se: é tensão
do começo ao fim.
Os créditos iniciais, uma linda
colagem que mistura documentos
e fotos da época com nomes dos
envolvidos na produção, dão a entender que, dos atores aos roteiristas, todos são, de alguma maneira,
subversivos de uma organização
clandestina.
Brant é a melhor coisa que poderia ter acontecido ao cinema nacional. Ele, sim, significa renovação.
Não faz concessões -não dirige
falas em inglês, que poderiam abrir
as portas de outros mercados,
doença que contamina cineastas
da pátria amada, nem pretende
teorizar sobre o Brasil.
Está longe, muito longe, do Cinema Novo, que arranhou a estética
e, consequentemente, afastou o
público. Brant não faz movimento,
não perde tempo. Brant não faz filme de arte, faz cinema. Enfim!
Já havia provado seu talento, no
ano passado, com "Os Matadores", seu premiado longa de estréia. Conseguiu um feito inédito,
lançar dois longas em dois anos;
parece coisa de cineasta norte-americano.
Trabalha com a mesma equipe
do primeiro filme: Sara Silveira
(produção), André Abujamra
(música) e Marcelo Durst (fotografia). O roteiro é também adaptação de uma história original de
Marçal Aquino, o mesmo de "Os
Matadores".
Todos os envolvidos do meio, inclusive a crítica, torcem por Brant.
Na exibição para convidados, na
última segunda-feira, em São Paulo, ele foi ovacionado antes de o filme começar. Porque todos sabiam
que não perderiam seu tempo.
Por sinal, foi uma das pré-estréias mais concorridas do Espaço
Unibanco. Porque todos querem
vê-lo seguindo em frente, filmando todos os anos. Por quê?
Porque ele é despretensioso, introduz novos atores. Porque o som
de seus filmes costuma ser bom, a
fotografia, idem, a direção de arte,
também. Porque, o mais importante, ele conta uma história, detalhe relevante mas escasso na maioria dos filmes de seus patrícios.
O elenco não tem o carisma de
"Os Matadores" -em que se destacavam Chico Diaz, Maria Padilha e Murilo Benício. Há escorregadas no roteiro, como a maçante
cena de "flashback" em que o casal
Lúcia e Miguel discutem "os rumos da luta, companheiro".
Mas, diferente de "Os Matadores", em que o silêncio falava mais
que as palavras, o ritmo de "Ação
entre Amigos" é frenético. Logo na
primeira cena, um helicóptero joga um corpo no mar.
Nunca ficou provado que tal método de tortura tenha acontecido
no Brasil. Aconteceu em terra.
Mas, pouco importa, foi um sonho, ou pesadelo. O filme não procura debater o período, nem ser didático. O período é um recurso
dramático para falar de algo mais
corrosivo à alma humana, o acerto
de contas, a superação.
Miguel (Zecarlos Machado), o
único dos quatro amigos ainda envolvido com política -é assessor
de um deputado-, é quem os leva
para a pescaria no interior de São
Paulo, onde ele acredita que viva o
delegado Correa, o torturador, oficialmente dado como morto. O
que está em jogo é a obsessão de
Miguel pelas dores do passado, enquanto os outros querem esquecer. Só isso já dá um filmão.
Ah, sim. A música de Abujamra é
algo que pouco se vê (se ouve) por
aqui. Com sua versatilidade e pesquisa de timbres, ele tem se revelado o maior compositor brasileiro
de trilhas.
²
Filme: Ação entre Amigos
Produção: Brasil, 1998; 76 min.
Direção: Beto Brant
Com: Leonardo Villar, Zecarlos Machado,
Cacá Amaral, Carlos Meceni, Genésio de
Barros, Sergio Cavalcante
Quando: a partir de hoje, no Espaço
Unibanco de Cinema e circuito
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