São Paulo, quarta-feira, 25 de outubro de 2000

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CRÍTICA
Banda aplica fórmula e produz um amontoado de singles

MARCELO VALLETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Não há grandes novidades em "All That You Can't Leave Behind", o novo disco do U2 -nem mesmo o fato de suas músicas estarem disponíveis em MP3 antes do aparecimento do CD nas lojas é inusitado, pois, após os novos trabalhos de Madonna e Radiohead chegarem aos ouvidos dos fãs primeiro pelo computador, o quarteto irlandês era a óbvia próxima vítima.
À parte a nova forma de divulgação do disco -involuntária, via softwares como o Napster e afins, apoiados pelos membros do grupo, por sinal-, parece que o U2 cansou de tentar impressionar pelo conceito dos álbuns -não quer mais ser "moderninho".
Se no trabalho anterior, "Pop", de 1997, o tal do conceito já era bem mais frouxo do que em "Zooropa" ou "Achtung Baby", no disco do ano 2000 a banda se limita a tentar produzir o máximo de singles possível. Simplicidade e convencionalismo são palavras que se aplicam ao novo CD. Será cansaço? Falta de ambição? Vergonha na cara, enfim?
Menos roqueiro do que no início da carreira, o U2 continua a dar destaque à voz de Bono -que canta como sempre, abusando do falsete, quase sempre irritante- e à guitarra de The Edge, que pontua a cozinha discreta de Adam Clayton e Larry Mullen com melodias pouco originais.
Uma certa volta aos anos 70 é efetuada por canções como "Wild Honey" e "Walk On", que soam fracas ao tentar aproximar-se do clima de parte de "Sticky Fingers", clássico dos Rolling Stones de 1971. Em compensação, Bono acerta em "In a Little While", de longe o melhor momento do disco, forçando a voz no território da soul music.
"Peace on Earth", guiada pela guitarra acústica, é sub-REM, enquanto "Stuck In a Moment You Can't Get Out of" combina guitarra, bateria e um discreto sintetizador, que embalam Bono em mais um refrão, simples e convencional -pop, enfim-, como outros que aparecem no disco.
É por caminho semelhante que vão "Kite" -a grandiloquência do refrão e o modo de cantar de Bono remetem a Bon Jovi, mas sem chegar a ser tão ruim- e o funk "Elevation" -esta, dona do momento eletrônico do álbum, mas bastante inferior à já débil "Discoteque", o carro-chefe de "Pop".
Os momentos mais enfadonhos são as arrastadas "New York" -quantas músicas com esse nome existem? De Lou Reed a Richard Ashcroft, passando pelos Sex Pistols, muitos roqueiros já bateram nessa tecla- e "Grace", que chegam a ser dispersivas.
Como sobra, reaparece "The Ground Beneath Her Feet", feita originalmente para a trilha sonora do filme "The Million Dollar Hotel", do amigo Wim Wenders.
É tudo muito familiar -e nada brilhante- em "All That You Can't Leave Behind". Já faz um certo tempo que a banda parou de contribuir com inovação para o pop, e a exacerbação da (simples, talvez até pobre) personalidade musical do U2 só não é tão bem-sucedida no momento atual de sua carreira porque nenhuma das novas canções de Bono e sua turma chegam aos pés de hits marcantes como "One" e "Stay (Faraway, So Close)". Mas ainda é melhor do que enveredar pela artificialidade.


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