São Paulo, sábado, 26 de fevereiro de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRÍTICA
Novo álbum inicia o enterro dos anos 90

da Reportagem Local


Eis aqui o primeiro produto de artista iniciante da geração 2000 na música popular brasileira. Se "Samba Raro" abre um novo flanco na combalida MPB, é impossível perceber neste momento, mas é expressivo que a MPB dos 2000 comece aqui.
Trata-se de um trabalho de busca de síntese, e aqui o uso do termo "samba" é artifício de efeito. Max de Castro, nesse primeiro momento, é um artista de rhythm'n'blues (mas de r'n'b brasileiro, como seu pai Simonal foi um artista de soul brasileiro e Tim Maia, um de funk brasileiro).
Essa tradição, a tradição black brasileira, está de fato quebrada, e na busca de síntese Max entrega a seu disco um objetivo ambicioso, duro de alcançar: retomar o fio deixado solto pela diáspora pós-AI-5 de um grupo heterogêneo e desideologizado, por que passaram Ben, Simonal, Tim, Cassiano, Toni Tornado, até os brancos Erasmo, Roberto e Elis.
Ele busca mais desideologização, acoplando universos de referência como os de Baden Powell.
A tentativa de síntese opera no disco um encadeamento de citações -as canções vão incorporando trechos de "Charles Jr." e "País Tropical" (de Ben), "Canto de Ossanha" (Baden e Vinicius), "Sonho de um Carnaval" (Chico), "Fica Mal com Deus" (Vandré).
A lógica, Chico Buarque à parte, é a de certo grau de exclusão, e é esse sentimento que ele parece querer vir vingar. Suas armas? Filho do pop star que pagou por se ostentar reacionário e truculento, Max vem inverter os sinais de seu pai: funda-se na doçura -a voz pequena, os temas nunca de "pilantragem", sempre de amor- e no zelo pela modernidade sonora.
Na sofisticação tecnológica de "Samba Raro", "Afro-Samba" ou "2 Bailarinas", se aproxima de contemporâneos bem diversos, como os mangue beat, Rica Amabis, Júpiter Maçã, os eletrônicos.
No que acaba soando tradicional, no entanto, é em não avançar no que talvez seja o grande impasse de sua geração: o sumiço da poesia, dos versos, da temática de texto, da autoria. É emblemático que seu parceiro seja um bom letrista da geração 80, Bernardo Vilhena, mas a impressão que atravessa as letras de "Samba Raro" é, muitas vezes, de falta de assunto.
A onda black sempre foi meio assim, e do amor se fazia a solução ("não quero dinheiro, só quero amar", rugia Tim Maia). A falta de romantismo dos dias que correm comprime Max no meio-termo ainda não revolvido entre a verborragia sem poesia do rap e o deserto de texto do tecno.
De resto, "Samba Raro" é soul e funk, é (sim) samba e samba-jazz, MPB e eletrônica -mas não é o ecletismo da combinação disso tudo, e sim um esforço de síntese. É coisa à beça para um iniciante só, a quem involuntariamente coube a tarefa de abrir os rituais de enterro dos anos 90. (PAS)


Avaliação:    

Disco: Samba Raro Artista: Max de Castro Lançamento: Trama Quanto: R$ 20, em média

Texto Anterior: Música: Max de Castro apresenta o samba raro
Próximo Texto: Mídia: Folha recebe seis prêmios de design
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.