São Paulo, segunda-feira, 26 de março de 2001

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HENRI SALVADOR

Músico diz entender se "Chambre avec Vue", que vem lançar em abril, não for bem recebido no Brasil

"O brasileiro é mesmo um povo superior"

FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE PARIS

Henri Salvador recebeu a Folha no restaurante do hotel Intercontinental em Paris. Animado com a possibilidade de ir ao Brasil promover seu disco, Salvador entrevistou quase tanto quanto foi entrevistado. Queria saber sobre a violência do país, o poder da mídia e os ritmos nordestinos. Adiantou seu descontentamento com o axé, praticou o português ("tudo bom" e alguns palavrões) e relembrou suas aventuras octogenárias. (GABRIELA MELLÃO)

Folha - O que fez o sr. interromper sua aposentadoria?
Henri Salvador -
Eu não ia mais fazer disco, só queria saber de sol e piscina. Mas, um dia, fui cantar numa TV, e minha amiga Corinne Joubard viu. Ligou no dia seguinte e disse: "Com essa voz, você não tem o direito de parar. Tem que fazer um disco". Respondi que não, estava adorando minhas férias. Ela não quis saber. "Pode deixar, me ocupo de tudo."

Folha - E por que bossa nova?
Salvador -
É a musica mais bonita do mundo. Recebi instruções para fazer o disco com que sempre sonhei, sem me preocupar com os custos. Segui à risca e, não sei por que, agradou aos jovens.

Folha - Achou que iria atrair um público de gosto mais apurado?
Salvador -
Não pensei que o público tivesse avançado tanto musicalmente. Isso aconteceu graças aos festivais de jazz. Agora a música que me agrada também agrada a todos. Antes, na França, as pessoas não compreendiam esse tipo de batida. A música francesa tem toda uma influência americana do rock'n'roll e do rap (faz careta) que atrasa. Não gosto muito.

Folha - Mas foi o sr. mesmo quem introduziu o rock na França.
Salvador -
Foi uma brincadeira que pegou. Fazia para me divertir, mas gostaram. Uma pena (risos).

Folha - Como se sente sendo uma das inspirações da bossa nova?
Salvador -
Quando me dou conta de que, graças a uma pequena música minha, fizeram a bossa nova, fico muito feliz. Mas, enfim, o verdadeiro autor é mesmo Tom Jobim. Tiro o chapéu para ele.

Folha - Como o sr. acha que o brasileiro vai receber sua bossa nova?
Salvador -
Amaria ser bem recebido, mas entenderia uma reação contrária. O brasileiro é realmente superior. Lembro como qualquer pessoa podia fazer um samba, bastava ter uma caixa de fósforos. Só posso ter respeito e admiração por um povo como esse.

Folha - Porque seu disco anterior, "Monsieur Henri", não deu certo?
Salvador -
Estava cercado de gente que não entendia nada de música e fui obrigado a fazer um disco de rock, para agradar a não sei que público. Foi um desgosto.

Folha - "Chambre avec Vue" é a antítese de seu trabalho anterior. O sr. se sente renascido?
Salvador -
Fazer esse disco foi prazer, não trabalho. E é claro que o sucesso muda a vida. Tenho pedido de turnês na Itália, Espanha e até nos EUA. Será divertido retornar ao palco -mas não mais do que dois shows por semana. Para não cansar o velho senhor...

Folha - O sr. cercou-se de jovens para o disco. Por que então divide autoria e microfone com Françoise Hardy em "Le Fou de la Reine"?
Salvador -
É uma dificuldade encontrar bons letristas na França. Os velhos não têm mais nada no coração, e os jovens só querem saber de música americana. Eu tinha gostado muito da versão que Françoise Hardy havia feito de uma música de Jean Mohain. Estava trabalhando com o filho dela, Thomas Dutronc, que também compôs. Então resolvi convidá-la para fazer uma letra para uma melodia minha. Ela me disse que estava com dificuldades e só fazia uma música por ano. Eu respondi: "Pois então é a minha!". Dois dias depois, me entregou "Le Fou de la Reine", e eu emendei: "Você não quer cantá-la também?".

Folha - O sr. disse que esse disco não é o seu último desafio. Quais são seus planos?
Salvador -
(Risos.) Tenho outras idéias. Já estamos na marca dos 600 mil discos vendidos. Tenho que esperar mais, até 1,5 milhão, talvez. Isso é bom, porque me dá tempo para preparar o próximo. Disseram-me que no Brasil o disco é uma coisa muito importante e é possível vender 1 milhão em uma semana. Não sabia.


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