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A marca da pantera
Reestréia de "Um Tiro no Escuro" e caixa comemorativa marcam os 40 anos do personagem
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PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
O Oscar especial entregue há
um mês para Blake Edwards, 82, e a reestréia nos cinemas hoje, em cópia nova, de "Um
Tiro no Escuro" fazem parte de
uma mesma estratégia promocional, envolvendo o lançamento de
uma caixa de DVDs com os filmes
da Pantera Cor-de-Rosa e um disco extra, com quatro documentários e outros agrados especiais para os fãs da série (incluindo vários
desenhos animados da Pantera).
É uma ação cada vez mais comum em Hollywood, fruto da lucrativa aliança entre memória e
comércio, estimulada pelo crescimento do mercado dos discos digitais. A necessidade de voltar
com pelo menos um desses filmes
à tela grande faz todo sentido na
medida em que o humor da série
"A Pantera Cor-de-Rosa", sob
certos aspectos, envelheceu bastante. Ela precisa ser apresentada
às novas gerações com uma nova
embalagem (a categoria "cult") e,
para tanto, a experiência coletiva
do cinema em que riso puxa riso é
absolutamente fundamental.
Mas como vai reagir o público
de hoje? A resposta é imprevisível.
Hollywood não abandonou o humor físico, é verdade, mas este tomou contornos bem diversos
com a emergência de Jim Carrey e
dos irmãos Farrelly ("Quem Vai
Ficar com Mary?"). A comicidade
da Pantera é de outra ordem, talvez muito mais ingênua, algo que
só acrescenta charme, mas a mantém como fenômeno do passado.
"Um Tiro no Escuro" (64), o filme eleito para voltar à tela grande,
é o segundo entre sete, quase todos muito bem-sucedidos na bilheteria. Para alguns, é mesmo o
melhor. Mas é difícil avaliar. Ele é
pelo menos tão bom quanto o originário "A Pantera Cor-de-Rosa"
(63), que estabeleceu os princípios cômicos do desastrado inspetor de polícia Jacques Clouseau.
De qualquer maneira, é certo que
a qualidade da série vai descendo
a ladeira até se desfazer na lama
com o oportunista "A Trilha da
Pantera Cor-de-Rosa", de 1983,
uma compilação de cenas de produções anteriores feita depois da
morte do protagonista Peter Sellers (em 1980, aos 55 anos, de ataque do coração).
Por pouco, aliás, Clouseau não
ganhou outro rosto. Sellers só entrou no filme quando o ator originalmente escalado, Peter Ustinov
(tão craque quanto, mas certamente não tão adequado), desistiu.
Em "A Pantera Cor-de-Rosa", o
inspetor quer prender um famoso
ladrão de jóias de identidade desconhecida. Imagina que seu próximo ataque será o roubo do diamante que dá título ao filme. O ladrão (David Niven, para variar,
ótimo) está o tempo todo sob o
seu nariz, mas Clouseau evidentemente não percebe nada.
"Um Tiro no Escuro" vai mais
fundo na combinação de "slapstick comedy" e "vaudeville".
Clouseau investiga uma série de
assassinatos no casarão de um
milionário, mas termina se apaixonando pela principal suspeita, a
empregada (Elke Sommer).
O sucesso da série da Pantera
Cor-de-Rosa é fruto da combinação feliz de três talentos: o "timing" do diretor Blake Edwards,
que faz comédia pelo difícil caminho dos planos longos, a música
de Henry Mancini e a coragem de
Peter Sellers, um ator cômico sem
medo do ridículo.
Sellers, como todo talento cômico perdido na lógica perversa do
prestígio hollywoodiano, só encontrou reconhecimento de fato
ao fazer um drama, "Muito Além
do Jardim" (Hal Ashby, 1979).
Mas seu gênio aparece por completo, de verdade, na série da Pantera Cor-de-Rosa, no sensacional
"Um Convidado Bem Trapalhão"
(68, também em dobradinha com
Edwards) e, é claro, em "Doutor
Fantástico", de Stanley Kubrick,
"tour de force" em que ele se divide em três papéis diferentes.
Um Tiro no Escuro
A Shot in the Dark
Direção: Blake Edwards
Produção: EUA, 1964
Com: Peter Sellers, Elke Sommer
Quando: a partir de hoje no Top Cine
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