São Paulo, sexta-feira, 26 de maio de 2000


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CINEMA/ESTRÉIAS

Malle narra amor e crime quase perfeitos

CARLOS ADRIANO
ESPECIAL PARA A FOLHA

S uspenso no alçapão de um elevador e solapado pelo amor de Jeanne Moreau, Maurice Ronet é condenado a não escapar da acusação de dois crimes.
Eis o fio condutor do primeiro longa-metragem do diretor francês Louis Malle, "Ascensor para o Cadafalso" (1957), que reestréia hoje em São Paulo.
É um filme pré-nouvelle vague, por razões de época, técnica e temática. A nova onda foi um movimento histórico do cinema francês, lançado em 1958 e 1959, que propôs ruptura estética e modos de produção livres do esquema de estúdio, colado existencialmente à vida e encapsulado numa "política dos autores".
Assistente de Bresson em "Um Condenado à Morte Escapou" (1956), Malle (1932-1995) se integra ao movimento com "Os Amantes" (1958) e "Trinta Anos Esta Noite" (1963).
O diretor não pertencia ao grupo de ácidos críticos dos "Cahiers du Cinéma", futuros cineastas. Sem o espírito revolucionário de Godard, Rohmer e Resnais ou o ímpeto sistemático de Truffaut, Chabrol e Rivette, Malle brilha no artesanato diligente e talentoso (não à toa, fez em Hollywood "Atlantic City" e "Pretty Baby", respectivamente em 1980 e 1978).
Em sua primeira performance como diretor, no filme "O Mundo do Silêncio" (1956), co-dirigido por Jacques-Yves Costeau, ganhou a Palma de Ouro no festival de Cannes.
Baseado em clássico da literatura barata (Noel Calef), "Ascensor para o Cadafalso" é um drama policial de erros e ironias, cujas peças favorecem a fabricação da mentira.
E há ainda a reflexão sobre o quanto as imagens podem revelar. Chabrol e Truffaut moldariam depois o gênero noir (de extração americana) na modernidade francesa.
O filme conta a história do amor/crime quase perfeito. Com o boêmio e ex-paraquedista na Indochina Julien Tavernier (Ronet), Florence Carala (Moreau) planeja matar o marido, poderoso homem de negócios.
Julien executa-o, como se fosse suicídio. Mas, por um lapso, volta ao lugar do crime e cai na armadilha do acaso. A força é desligada, o elevador pára e vira veículo para seu infortúnio.
Objeto de culto e marco no uso de jazz no cinema, a música original de Miles Davis (registrada em sessão de improviso quando passou por Paris) vê Florence com luzes da cidade ao fundo fora de foco, enquanto a montagem paralela trama o homem confinado e a mulher caminhando.
A parada do elevador é funcional, libera movimentos dos personagens no mundo: ela nas ruas em busca do amado; o jovem casal transviado em tola jornada.
Outro destaque é o olhar de Moreau para a câmera: no início, declama juras e conjurações de amor; no final, medita sobre sua sina.
Um achado, neste caso de perdas e paixão partida, é que, durante o tempo do filme, Florence e Julien nunca se encontram.
Vemos os dois "juntos" apenas em duas cenas, sob mediação técnica: no início, conversam ao telefone, e, no final, quando ela vê o idílio amoroso (agora morto) ser eternizado em instantâneos fotográficos.


Ascensor para o Cadafalso
Ascenseur pour l'Échafaud     Direção: Louis Malle Produção: França, 1957 Com: Jeanne Moreau, Maurice Ronet, Lino Ventura Quando: a partir de hoje no Top Cine 2




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