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CINEMA/ESTRÉIA
"Agnes Browne" é bacaninha, tem humor e coração
MARCELO RUBENS PAIVA
ESPECIAL PARA A FOLHA
O s irlandeses são os brasileiros da Europa. Lá, como
cá, o país é uma coerente bagunça, a violência política corre solta,
a desigualdade social se escarrapacha, mas o povo é alegre, caloroso e cínico. Fora que, lá, como
cá, gostam de cerveja, de papo-furado e de futebol. Nos EUA, quando o objetivo é comemorar com
excessos, vai-se a um bar irlandês.
O lance é que um grande estúdio, quando retrata em uma produção um povo excêntrico assim,
costuma cair na tentação de estereotipá-lo. "Agnes Browne - O
Despertar de uma Vida", filme dirigido e estrelado por Anjelica
Houston ("A Família Addams",
"A Honra do Poderoso Prizzi"),
que já havia dirigido "Marcas do
Silêncio", não chega a se lambuzar ou enfiar o pé no lodo das simplificações geradas pelo estereótipo, mas também não se livra dele.
O filme, produzido por nomes
que estão nos créditos de "Coração Valente" e "Meu Pé Esquerdo", retrata uma comunidade alegre, unida, que enxuga as lágrimas em "pubs", misturando as faces da cultura irlandesa num mesmo caldeirão. É um filme bacaninha, com humor e coração. Não
muda a vida de ninguém. Mas
não tem por que não ser visto.
Agnes Browne tem sete filhos
(seis capetas e uma menina), variando entre 2 e 14 anos de idade.
O marido de Agnes morre, no começo do filme. Como morre,
também, o carro que leva o seu
caixão para o cemitério, no meio
do cortejo. O carro chega empurrado, num cemitério em que
acontecem outros dois enterros,
confundindo os familiares dos
mortos, que se misturam e acompanham o enterro de estranhos.
Está aí a dica, entregue logo de
cara: o filme tem humor negro, a
tragédia é bem assimilada, vamos
lá, então, acompanhar o que
acontece com essa viúva, que vende frutas numa barraca, na rua do
Mercado, periferia de Dublin.
Anjelica Houston, a viúva, morou em Dublin, inspirou-se numa
antiga babá, está à vontade com o
sotaque irlandês e conduz o filme
homenageando a vida das mulheres de tempos atrás.
Ambientado em 1967, baseado
no romance "The Mammy", de
Brendan O'Carroll, que também
assina o roteiro, o filme é "de época", porque quase ninguém mais
tem sete filhos, hoje em dia, e fala
de mulheres de sua época, que
não tinham orgasmos com os maridos e confessavam timidamente
para a melhor amiga. "Mas existe
mesmo o orgasmo? Pensei que
fosse uma ficção", Agnes comenta
com sua amiga Marion (Marion
O'Dwyer, atriz de teatro que nunca havia feito um filme).
Segundo problema do filme: ser
"de época", de uma época não tão
distante assim. Ou o problema é
meu, que já vê nas telas como "de
época" aquilo que vivi quando já
mocinho, ou melhor, garotinho.
Agnes é fã de Tom Jones, que
também atuou como ele próprio
no filme "Marte Ataca", de Tim
Burton. Também porque Mr. Jones, em carne e osso, aparece no
filme "Agnes Browne" para cantar e insolitamente resolver as encrencas da família Browne.
Quer saber de uma coisa? O filme é bom. O público feminino vai
adorar. Agnes tem de se virar para
sustentar os filhos, encarar o câncer da melhor amiga, resolver
uma parada com o agiota da área
e abrir seu coração para as pretensões honestas do padeiro francês.
Bons ingredientes para montar
uma sopa de fotogramas.
Agnes Browne - O Despertar de
uma Vida
Agnes Browne
Direção: Anjelica Houston
Produção: EUA, 1999
Com: Anjelica Houston
Quando: a partir de hoje, no cine Sala
UOL de Cinema e circuito
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