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TEATRO
"Lisbela e o Prisioneiro", de Guel Arraes, encanta pela singeleza
SÉRGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Dizer que "Lisbela e o Prisioneiro" é transposição para teatro de um seriado de TV seria equivocado, tanto em relação
ao espetáculo quanto ao diretor.
Guel Arraes adaptou o romance
de Osman Lins originalmente para uma minissérie da Globo, em
cenas curtas de sucessão vertiginosa, distanciadas de quando em
quando por vinhetas comicamente anacrônicas, mas esse seu modo inconfundível de contar histórias se presta com igual eficácia
em qualquer mídia.
A desenvoltura intermídia de
Guel se torna evidente pelo fato de
que sabe pôr em cena todos esses
recursos a serviço da história que
conta, sem que nunca roubem o
foco do delicioso texto de Lins e
do lúdico desempenho dos atores.
Não quer impressionar pela modernidade, pelo contrário: estabelece uma cumplicidade imediata
com o público, ancorando-se firmemente no universo em que está confortável, a farsa brasileira.
O romance de Lins faz fronteira
ao norte com Suassuna, pela engenhosa comédia de erros na qual
se sucedem em reviravoltas traições e juras de morte, falsos galãs
e valentes escachados. Pelas frases
de espontânea poesia, sínteses de
Shakespeare e cordel ("Lisbela me
condenou à vida sem ela", "Se eu
morrer, vou ter saudades de
mim"), faz fronteira ao sul com
Guimarães Rosa.
A fábula da paixão de Leléu,
moço que se deslumbrou ao ver o
zepelim e "se danou no mundo",
por Lisbela, a filha do delegado
que sonha no cinema enquanto
não casar com Douglas, falso carioca, candidato a corno, revela
até a subversão o universo do brasileiro que se deslumbra com o
sonho americano e não quer mais
acordar no precário.
O espetáculo talvez perca consistência ao confiar demais no
"ruinzinho" do teatro de revista,
sobrecarregando as marcas e exagerando os tipos. Escapa do besteirol, no entanto, graças a dois
grandes desempenhos. Virgínia
Cavendish, a Lisbela que chora todas as lágrimas e beija todos os
beijos do cinema americano, sabe
tornar tocantes os clichês que diz,
pela fé ingênua com que os assume. Tadeu Mello se adequa tão
completamente ao patético Cabo
Citonho que torna o tipo desde já
imortal, assumindo assim, na
academia da chanchada nacional,
a cadeira de Oscarito.
Não é nem americano nem nada para impressionar, mas o espetáculo encanta pela singeleza e faz
com que a gente saia do teatro reconciliado com a gente mesma.
"Lisbela e o Prisioneiro" é como
beijo em cinema: familiar e inesquecível.
Lisbela e o Prisioneiro
Texto: Osman Lins
Direção: Guel Arraes
Com: Virgínia Cavendish, Bruno Garcia
Onde: teatro Hilton (av. Ipiranga, 165,
região central, tel. 0/xx/11/259-6508)
Quando: sex., às 21h30; sáb., às 19h30 e
21h30; dom., às 18h. Até 1º/7
Quanto: R$ 25
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