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MÚSICA
Baterista nigeriano que tocou nas bandas de Fela Kuti apresenta-se pela primeira vez no país, ao lado de Sandra de Sá
Pulso de Tony Allen une Brasil e África
ALEXANDRE MATIAS
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Como o multiinstrumentista nigeriano Fela Kuti (1938-97) exigiu
o holofote da história para seus
discursos de ritmo incendiário, o
baterista Tony Allen foi deixado
em segundo plano como uma espécie de Sancho Pança do jazz-funk africano. Mas basta ouvir
qualquer álbum de Kuti para entender que Allen era a força motriz e a arma secreta das bandas
do artista -Africa 70 e Egypt 80.
Allen era companheiro de longa
data e tocava com Kuti desde os
tempos em que sua banda chamava Koola Lobitos. Formado nos
anos 60 apenas por estudantes nigerianos que faziam faculdade em
Londres, o grupo logo passaria
por uma drástica transformação
em sua primeira turnê aos EUA.
Lá, Fela Kuti foi apresentado à
nata de uma cultura negra em plena ebulição, que incluía free jazz,
movimentos políticos e rock alto.
Absorveu com a mesma intensidade as palavras de Jimi Hendrix,
Malcolm X, Ornette Coleman, Sly
Stone e Eldrigde Cleaver e mudou
a banda: a partir daquela viagem
de 1969, os Koola Lobitos se tornavam Fela Kuti & Africa 70 e
nascia um novo gênero musical, o
afro-beat.
Idealizado por Kuti, o gênero
não sairia do lugar não fosse o
pulso preciso de Allen, que se
apresenta hoje e amanhã dentro
da programação do Fórum Mundial de Cultura. Kuti morreu em
1997, mas o trabalho de Allen continua a pleno vapor. Ele, que já havia colaborado com grandes nomes do pop africano (como Manu
Dibango e Ray Lema), passou as
duas últimas décadas experimentando gêneros desconhecidos e
possibilidades em estúdio. Lançou seu último disco, "Home
Cooking!", em 2003, e tem colaborado com Damon Albarn, vocalista do grupo inglês Blur, e com
o novíssimo MC e produtor inglês
Ty. Leia a seguir os principais trechos da entrevista que Tony Allen
deu à Folha.
Folha - Que semelhanças você vê
entre a música brasileira e a do
continente africano?
Tony Allen - O Brasil tem muitas
semelhanças com a África, por serem continentes de ritmos que
surgiram do sofrimento. Tivemos
a escravidão no passado, que nos
tornou irmãos de sangue. E são
culturas de países que não tiveram oportunidade de desenvolvimento, por isso são culturas nascidas na pobreza, mas que não são
pobres. Há um lado na pobreza
que não é tão negativo, que faz
com que os pobres vivam mais do
que os ricos, tenham mais experiência e intimidade com a vida
do que aqueles que se dizem ricos.
E, para falar dessa vida, eles colocam a boca no mundo.
Folha - Você tem algum artista
brasileiro favorito?
Allen - Gosto especificamente de
Gilberto Gil, que é uma pessoa em
que eu sempre presto atenção. Ele
é tão político quanto artista, tem
uma desenvoltura muito boa para
falar e idéias que realmente importam. E tem estilo. Seu violão é
uma assinatura inconfundível.
Folha - Ele é o atual ministro da
cultura do Brasil...
Allen - Sim, eu sei, e parece uma
escolha óbvia para o cargo -não
por ser um artista representativo
do Brasil, que também ele é, mas
por ter uma visão ampla de toda a
situação. Acredito que o fato de eu
estar finalmente indo para o Brasil está diretamente ligado ao seu
cargo no governo. Não que ele tenha me convidado ou intercedido
ao meu favor, mas estamos na
mesma sintonia.
Folha - Você o conhece?
Allen - Não, mas adoraria. Quem
sabe, nessa viagem... Também
não conheço Sandra de Sá, com
quem irei tocar aí, mas acho que
terei uma ótima oportunidade
para conhecer seu trabalho.
Folha - Desde os anos 80, você está atento a outros gêneros musicais e novas técnicas de gravação...
Allen - Houve uma época em
que eu percebi que o afro-beat poderia se estagnar, parar no tempo.
E a música tem que se mover. E, se
havia a possibilidade de um ritmo
rico e forte como o afro-beat parar no tempo, eu mesmo teria que
colocá-lo andando de novo. Por
isso comecei a me aproximar de
artistas de hip hop, produtores de
dub e de dance music.
TONY ALLEN E SANDRA DE SÁ.
Quando: hoje, às 20h30, no Sesc
Pompéia (r. Clélia, 93, Pompéia, SP, tel.
0/xx/11/3871-7700), e amanhã, às 15h,
no Sesc Itaquera (av. Fernando do
Espírito Santos Alves Matos, 1.000,
Itaquera, SP, tel. 0/xx/11/6521-7272).
Ingressos: R$ 15.
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