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ERUDITO
Intérprete controverso, pianista brasileiro lança dois CDs duplos em que conduz obras do mestre do barroco alemão
João Carlos Martins rege Bach com discrição
Divulgação
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O pianista João Carlos Martins, que rege obras de Bach em CDs |
IRINEU FRANCO PERPÉTUO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Um dos mais controversos
intérpretes das obras de
Bach ao teclado, João Carlos Martins agora se volta para a criação
orquestral do mestre do barroco
alemão. Ele inaugura sua carreira
fonográfica como regente com
dois CDs duplos: um com os concertos brandemburgueses, à frente da English Chamber Orchestra,
e outro com as suítes para orquestra, dirigindo a Bachiana Chamber Orchestra.
Martins, 65, teve um começo
flamejante como pianista: seu álbum com um concerto para piano do argentino Alberto Ginastera, acompanhado pela excelente
Sinfônica de Boston, sob regência
do mítico Erich Leinsdorf, é item
de colecionador que mostra um
fazer musical de altíssimo nível.
Veio, a seguir, uma série de problemas de saúde que o levaram a
interromper temporariamente a
carreira, restringir-se ao repertório para mão esquerda e, por fim,
abandonar as atividades pianísticas, em 2002. Em seguida começou a reger, montando a Bachiana
Chamber Orchestra com músicos
de orquestras paulistanas.
Como intérprete de Bach, ele
causou muita polêmica, pois atacava o piano como o grande instrumento de concerto consolidado no século 19, sem jamais tentar
fazê-lo se parecer com os cravos
que o compositor germânico tinha à sua disposição no século 18.
Assim, suas gravações tinham
extremos de dinâmica, uso abundante dos pedais e uma visão especialmente instintiva da ornamentação. Resultado: enquanto
uns, conquistados, viam nas liberdades poéticas de João Carlos
Martins culminâncias dignas do
pianista canadense Glenn Gould,
outros, horrorizados, chocavam-se com as liberdades tomadas.
Com o passar dos anos as diferenças foram se aplainando. De
um lado, na escola de interpretação "autêntica" de música barroca, o rigor e o cerebralismo dos intérpretes britânicos e flamengos
foi cedendo passo a novos grupos
italianos, como Il Giardino Armonico e Europa Galante.
De outra parte, intérpretes "modernos" descobriram que não podiam mais ignorar as conquistas e
descobertas da escola "de época".
Mesmo em instrumentos "modernos", não é mais aceitável tocar Bach com vibrato constante e
tempos excessivamente lentos.
Como reflexo de tais tendências, o Bach orquestral de João
Carlos Martins soa muito mais
comportado do que suas interpretações pianísticas do compositor germânico. Bastante elucidativo, por exemplo, é comparar sua
realização atual do "Concerto
Brandemburguês n.5" com o
mesmo registro da peça que ele
fez em 1996, como pianista, à
frente dos Solistas de Sofia.
Além da cristalina qualidade sonora dos discos atuais, salta aos
ouvidos a diferença de equilíbrio
provocada pela escolha, hoje, de
um cravista discreto como Robert
Aldwinckle, em oposição ao pianismo extrovertido de Martins
em 1996. Mas não é só isso: os
tempos da gravação com a English Chamber Orchestra são
muito mais ágeis, e as escolhas de
articulação e fraseado também
convencem em maior medida.
Surpreende o resultado conseguido pela Bachiana Chamber
Orchestra, que tem em Laércio Sinhorelli Diniz um "spalla" de inteligência e bom gosto, e tem a
maioria das estantes integradas
por musicistas que lideram ou já
lideraram seus naipes nas sinfônicas de que são membros.
Na célebre "Ária" da suíte n.3, a
linha bachiana é preservada sem
apelos sentimentalóides ou ultra-romantizantes. E há trechos de tirar o fôlego, como o virtuosismo
de Maurício Freire na "Badinerie"
da segunda suíte, ou o brilho dos
trompetes na abertura da terceira.
Em geral, trata-se de uma interpretação sóbria, na qual as novidades que eventualmente surgem
na dinâmica ou ornamentação
constituem antes bem-vindas
surpresas do que sustos a derrubar o ouvinte da cadeira.
João Carlos Martin's Bach:
Brandenburg Concertos
João Carlos Martin's Bach:
Orchestral Suítes 1-4
Gravadora: Tomato Records/ Atração
Fonográfica
Quanto: R$ 35 (cada CD duplo, em
média)
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