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Crítica/"Shortbus"
Cameron Mitchell captura o transbordamento do tesão
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
O sexo no cinema costuma ser refém de dois tipos de representação.
Ou a pornográfica, com seu
modo mecânico de mostrar os
corpos, associando-os a uma
performance de circo, com malabarismos e excessos. Ou a filosófica, na qual o sexo se irmana à pulsão de morte quando levado às últimas conseqüências,
como o fizeram com maestria
Pasolini em "Salò" e Oshima
em "Império dos Sentidos".
No cinema mais recente, diretores como Michael Winterbotton (em "Nove Canções"),
Cathérine Breillat ("Romance"
e "Sexo É uma Comédia") e
Vincent Gallo (em "Brown
Bunny") tentaram desculpabilizar o sexo, mas com resultados não mais que razoáveis.
Pois o que faltava ao sexo filmado é sua própria razão de
ser: o prazer e a alegria, ausentes desde que a Aids impôs novos hábitos através do medo. E
esses dois fatores é que fazem
de "Shortbus" um filme não
apenas ousado, mas delicioso.
A cena de abertura, focada
numa Estátua da Liberdade em
papel machê, da qual a câmera
parte para planar sobre uma
Manhattan de brinquedo, dá o
tom da abordagem libertária e
libertina com que o diretor
John Cameron Mitchell aborda
a sexualidade.
Em seguida, um conjunto de
cenas de sexo retratadas sem
pudores acentua a autenticidade de sua visão.
Pois é pelo ângulo da liberdade que o diretor encara a sexualidade. Além do despudor das
tramas sobrepostas e reunidas
no clube de encontros que dá título ao filme, impera um amoralismo na sua abordagem.
Desde a cena de abertura, uma
espécie de espírito infantil (antes, portanto, de qualquer moral) plana sobre o filme.
Aqui, os corpos se tornam o
veículo de uma experimentação do desejo, e o gozo é a emanação de uma alegria. Desse
modo, o sexo perde toda a sua
carga de culpa e volta a ser aquilo que é: uma entrega física na
qual nós humanos fazemos as
pazes com a natureza.
Mais importante: raramente
se viu no cinema um filme feito
com tanto tesão.
SHORTBUS
Direção: John Cameron Mitchell
Onde: hoje, às 22h, no Reserva Cultural Sala 2; amanhã, às 23h40, no Espaço Unibanco de Cinema 1; sáb., às 23h0,
na Sala UOL de Cinema; qua. (dia 1º),
às 23h30, no Unibanco Arteplex 2
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