São Paulo, segunda-feira, 26 de novembro de 2007

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"Cleópatra", de Bressane, divide platéia em Brasília

Durante a sessão competitiva do filme, enquanto alguns espectadores gritavam "bravo!", outros diziam: "Que bosta!'

Em debate sobre o filme, diretor rebateu jornalista que chamou seu longa de "patético" dizendo: "Nada do que você gosta é bom"

SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA

Em duas horas de projeção (na noite de sexta) e em duas horas e 20 minutos de debate (na tarde de sábado), no 40º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, o novo longa-metragem de Julio Bressane, "Cleópatra", produziu o mesmo efeito: uma leva de opiniões radicais e antagônicas.
A sessão competitiva de "Cleópatra" terminou sob vaias e aplausos simultâneos. Enquanto alguns espectadores gritavam "bravo!", outros reagiam com "que bosta!".
No dia seguinte, o diretor atribuiu à "fenomenologia do milagre" a numerosa presença de interessados em debater o filme -o auditório reservado à discussão estava lotado.
Como faz com recorrência, Bressane tratou a si mesmo e à sua obra como elementos isolados no panorama atual do cinema brasileiro.
"A coisa artística ficou esterilizada no cinema brasileiro. Ficou isso que está aí -um cinema esterilizado artisticamente", disse. O diretor atribuiu ao "processo de bossalização" o fato de que seu filme "talvez pareça novidade", quando, na verdade, se trata de "uma narrativa simples e convencional".
Dos debatedores, Bressane ouviu avaliações tão distintas de "Cleópatra" como "sublime" e "orgasmo estético" ou "constrangedor" e "patético".
Ao jornalista Marcos Petrucelli, da rádio CBN, que adjetivou o filme como "patético", Bressane respondeu: "Nada do que você gosta é bom. A força está no que é bom e você não gosta. O esforço é [necessário] quando você não gosta. A força está na ignorância. Pelo menos se curve".
Antes, o diretor classificara o cinema como "um instrumento radical de transformação", que exige do artista "um esforço de contradição consigo mesmo, de esquecer a sua mediocridade".
Intérprete de Cleópatra, Alessandra Negrini disse que o filme é "um exercício de linguagem" e falou do aspecto kitsch. "Cleópatra virou uma figura mítica e kitsch. Isso tinha de estar lá, na figura de um ator global fazendo [a personagem]."
Quando tomou a palavra, o cineasta Edgar Navarro (vencedor em Brasília em 2005 com "Eu me Lembro") identificou Bressane como um dos "três imortais" do cinema brasileiro -sendo os demais Glauber Rocha e Rogério Sganzerla-, mas disse perceber em sua atitude "certo pedantismo" e desejar que ele "descesse do Olimpo".
Navarro disse não fazer "uma crítica acintosa" e arrematou: "Você é tão podre quanto o sol". Ele citava o próprio Bressane, que falara do efeito cegante do sol, se olhado diretamente, do qual Ísis/Cleópatra seria uma representação metafórica.
Bressane evitou responder a Navarro. Preferiu comentar a intervenção anterior, da ex-professora universitária Ana Holland, que afirmou ter saído da sessão sentindo-se "meio tonta, sem fôlego" e disse que levará "dez anos" para entendê-lo. "Esse filme é para você", concluiu Bressane.


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