São Paulo, quinta-feira, 26 de novembro de 2009

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COMIDA

Pudim sem leite?

Chefs fazem releituras da receita, simples e internacional, e incorporam ingredientes como essências aromáticas, tapioca e frutas

LUIZA FECAROTTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um caderno com páginas amareladas guarda a secreta receita do pudim de leite do judaico Shoshi Delishop, no Bom Retiro. Escrita em búlgaro pela avó de Shoshana Baruch, 62, a fórmula está nos domínios da família há mais de 80 anos.
Feito diariamente apenas pelas mãos da matriarca, o pudim é especialmente leve e delicado. Ingredientes? Leite, açúcar e ovos. E só. O que dona Shoshana mantém em segredo são as proporções e o modo de preparo, que repete rigorosamente sempre que entra na cozinha.
Fora de lá, no entanto, essa fórmula básica tem sido incrementada por novos ingredientes. Gelatina, pão, fruta-do-conde, tapioca, leite de coco...
"Temos trazido sabores para a mesma base e ampliado nosso universo para fazer uma nova leitura dessa receita tão simples", diz a chef-consultora Ana Soares, que elaborou o pudim de pão do Astor, feito com brioche, "para ficar mais leve", e caramelo de vinho do Porto, "bem português". "Minha mãe fazia um com queijo parmesão, que dava uma picância, uma graça", diz a chef.
Foi a priprioca, uma raiz brasileira da qual Alex Alata extrai uma essência aromática, que deu notas amadeiradas e de ervas secas ao pudim do D.O.M., que tem na base leite, açúcar e gelatina. "É recorrente no mundo, todas as culturas fazem o pudim de leite com a mesma técnica", diz Atala. No Mocotó, o clássico também ganha versão brasileira, com tapioca.
Rodrigo Oliveira conta que demorou dois meses para acertar a receita, inspirada no pudim que a chef Mara Salles, do Tordesilhas, ensinou a ele em uma aula de cozinha brasileira.
"Cheguei a uma construção de texturas. Creme delicado embaixo, depois o granulado da tapioca e o coco integral ralado e torrado por cima, bem crocante." Na calda, aparecem caramelo, leite de coco fresco e anis, que dá um "toque picante de especiarias".
A mesma aula despertou a curiosidade de Adriana Cymes, do bufê Arroz de Festa (tel. 0/ xx/11/3896-6029), que reformulou a receita para torná-la mais leve. "Coloquei mais clara em neve e diminuí a tapioca." Para servir, substituiu o caramelo pela baba de moça.
Frutas também podem ser incorporadas à receita. É o caso da fruta-do-conde, usada no pudim do Carlota. Carolina Brandão, braço direito da chef Carla Pernambuco, diz que a intenção era dar uma nova apresentação à fruta para a qual "ninguém dá muito valor". Mistura de polpa, gelatina incolor e leite condensado, resulta nessa espécie de musse, que vai à mesa decorada com carambola e calda de baunilha e limão.
Numa adaptação do clássico pudim de leite e caramelo, o confeiteiro Flavio Federico serve em sua loja, Sódoces, um macaron recheado com o doce. Para quem quer acertar a textura da receita original, lisa e mais leve, que "desmancha na boca", ele aconselha a ficar atento à temperatura da água do banho-maria, na qual o pudim é preparado. Segundo Federico, a proteína do ovo coagula a 85ºC e, se a água estiver acima dessa temperatura, "o pudim fica com gruminhas".
Mesmo sem ser tão detalhista, o alagoano José Pereira dos Santos faz um cremoso pudim com base de creme de leite, no tradicional La Cocagne. Foi da França que trouxe a receita do doce, com toque cítrico e o sabor adocicado do vinho moscato. Na calda, ameixas secas vão ao fogo com cascas de limão e de laranja, conhaque e canela.
Coloque de lado todos esses ingredientes. Ainda assim, é possível fazer uma leitura de pudim... de claras. É como Vanda Barreto, do Barra Baiana, faz sua sobremesa mais famosa.
Claras em neve misturadas lentamente com açúcar e raspas de limão. Para untar a forma, o método é o mesmo do pudim tradicional: use caramelo. "O segredo está no fogo." Faça o pudim em banho-maria sobre a chama do fogão. "Atenção para a água não secar." Esse cuidado, aliás, se repete sempre, não importa a versão que escolher.



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