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COMIDA
Pudim sem leite?
Chefs fazem releituras da receita, simples
e internacional, e incorporam ingredientes como essências aromáticas, tapioca e frutas
LUIZA FECAROTTA
DA REPORTAGEM LOCAL
Um caderno com páginas
amareladas guarda a secreta receita do pudim de leite do judaico Shoshi Delishop, no Bom
Retiro. Escrita em búlgaro pela
avó de Shoshana Baruch, 62, a
fórmula está nos domínios da
família há mais de 80 anos.
Feito diariamente apenas pelas mãos da matriarca, o pudim
é especialmente leve e delicado. Ingredientes? Leite, açúcar
e ovos. E só. O que dona Shoshana mantém em segredo são
as proporções e o modo de preparo, que repete rigorosamente
sempre que entra na cozinha.
Fora de lá, no entanto, essa
fórmula básica tem sido incrementada por novos ingredientes. Gelatina, pão, fruta-do-conde, tapioca, leite de coco...
"Temos trazido sabores para
a mesma base e ampliado nosso
universo para fazer uma nova
leitura dessa receita tão simples", diz a chef-consultora Ana
Soares, que elaborou o pudim
de pão do Astor, feito com brioche, "para ficar mais leve", e caramelo de vinho do Porto,
"bem português". "Minha mãe
fazia um com queijo parmesão,
que dava uma picância, uma
graça", diz a chef.
Foi a priprioca, uma raiz brasileira da qual Alex Alata extrai
uma essência aromática, que
deu notas amadeiradas e de ervas secas ao pudim do D.O.M.,
que tem na base leite, açúcar e
gelatina. "É recorrente no
mundo, todas as culturas fazem
o pudim de leite com a mesma
técnica", diz Atala. No Mocotó,
o clássico também ganha versão brasileira, com tapioca.
Rodrigo Oliveira conta que
demorou dois meses para acertar a receita, inspirada no pudim que a chef Mara Salles, do
Tordesilhas, ensinou a ele em
uma aula de cozinha brasileira.
"Cheguei a uma construção
de texturas. Creme delicado
embaixo, depois o granulado da
tapioca e o coco integral ralado
e torrado por cima, bem crocante." Na calda, aparecem caramelo, leite de coco fresco e
anis, que dá um "toque picante
de especiarias".
A mesma aula despertou a
curiosidade de Adriana Cymes,
do bufê Arroz de Festa (tel. 0/
xx/11/3896-6029), que reformulou a receita para torná-la
mais leve. "Coloquei mais clara
em neve e diminuí a tapioca."
Para servir, substituiu o caramelo pela baba de moça.
Frutas também podem ser
incorporadas à receita. É o caso
da fruta-do-conde, usada no
pudim do Carlota. Carolina
Brandão, braço direito da chef
Carla Pernambuco, diz que a
intenção era dar uma nova
apresentação à fruta para a qual
"ninguém dá muito valor". Mistura de polpa, gelatina incolor e
leite condensado, resulta nessa
espécie de musse, que vai à mesa decorada com carambola e
calda de baunilha e limão.
Numa adaptação do clássico
pudim de leite e caramelo, o
confeiteiro Flavio Federico
serve em sua loja, Sódoces, um
macaron recheado com o doce.
Para quem quer acertar a textura da receita original, lisa e mais
leve, que "desmancha na boca",
ele aconselha a ficar atento à
temperatura da água do banho-maria, na qual o pudim é preparado. Segundo Federico, a proteína do ovo coagula a 85ºC e,
se a água estiver acima dessa
temperatura, "o pudim fica
com gruminhas".
Mesmo sem ser tão detalhista, o alagoano José Pereira dos
Santos faz um cremoso pudim
com base de creme de leite, no
tradicional La Cocagne. Foi da
França que trouxe a receita do
doce, com toque cítrico e o sabor adocicado do vinho moscato. Na calda, ameixas secas vão
ao fogo com cascas de limão e
de laranja, conhaque e canela.
Coloque de lado todos esses
ingredientes. Ainda assim, é
possível fazer uma leitura de
pudim... de claras. É como Vanda Barreto, do Barra Baiana, faz
sua sobremesa mais famosa.
Claras em neve misturadas
lentamente com açúcar e raspas de limão. Para untar a forma, o método é o mesmo do pudim tradicional: use caramelo.
"O segredo está no fogo." Faça o
pudim em banho-maria sobre a
chama do fogão. "Atenção para
a água não secar." Esse cuidado,
aliás, se repete sempre, não importa a versão que escolher.
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