São Paulo, sexta-feira, 26 de novembro de 2010

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CRÍTICA COLETÂNEA

Mário de Andrade pensa o cinema como arte

Em artigos reunidos, modernista faz importante reflexão sobre a produção nacional do começo do século 20


O MÉRITO É RESSALTAR A SERIEDADE E O INTERESSE QUE ELE DEDICOU À "SÉTIMA ARTE", NUMA ÉPOCA QUE AINDA ERA DISCUTIDA A VALIDADE ARTÍSTICA DA NOVA LINGUAGEM


ALCINO LEITE NETO
EDITOR DA PUBLIFOLHA

Em 1922, Mário de Andrade (1893-1945) fez a seguinte ressalva ao filme "Do Rio a São Paulo para Casar", do diretor paulista José Medina: "Acender fósforos no sapato não é brasileiro. Apresentar-se um rapaz à noiva, na primeira vez que a vê, em mangas de camisa, é imitação de hábitos esportivos que não são nossos".
E aconselha: "É preciso compreender os norte-americanos e não macaqueá-los. Aproveitar deles o que têm de bom sob o ponto de vista técnico e não sob o ponto de vista dos costumes".
A pequena crítica, publicada na revista "Klaxon" sob o pseudônimo R. de M., não é feita só de repreensões e termina assim: "Aplauso muito sincero. Seguiremos com entusiasmo os progressos da cinematografia paulista".
Não foi o que ocorreu. O autor desistiu de comentar filmes brasileiros, embora não tenha parado de escrever críticas de cinema até 1943, dois anos antes de sua morte, aos 51 anos.
Não foram muitas e foram esporádicas. Esses textos formam, porém, no conjunto, uma das reflexões mais importantes a respeito da arte cinematográfica feitas no Brasil na primeira metade do século 20.
É de espantar que só agora tenham sido reunidas em livro, graças à iniciativa do pesquisador Paulo José da Silva Cunha e da editora Nova Fronteira.
"No Cinema", que chegará às livrarias em dezembro, traz 19 críticas escritas por Mário durante duas décadas.
Boa parte delas já era conhecida, como "Fantasia de Walt Disney", de 1941, uma das melhores análises já feitas do desenho animado.
Apenas um texto é inédito: uma segunda reescritura do artigo "Caras", de 1934. Além de permitir a leitura organizada das críticas de Mário de Andrade, o mérito da coletânea é ressaltar a seriedade e o interesse que ele dedicou à "sétima arte", numa época em que ainda era discutida a validade artística daquela nova linguagem.
Muito bem informado a respeito dos debates que a inteligentsia europeia travava sobre o cinema, o escritor se aproximava dos filmes sem preconceito, buscando entender as suas especificidades estéticas bem como as suas relevâncias culturais e sociais.

OBJETOS DE PRAZER
Impressiona também o diagnóstico precoce que Mário faz do principal problema a impedir que o cinema ganhasse autonomia artística: os já rigorosos ditames comerciais da indústria cinematográfica.
"A cinematografia é uma arte. Ninguém mais, sensato, discute isso", ele escreve em 1922, no artigo "Cinema". "As empresas produtoras de fitas é que não se incomodam em produzir obras de arte, mas objetos de prazer mais ou menos discutíveis que atraiam o maior número de basbaques possível."
Dos 19 artigos que compõe essa coletânea, 11 são a respeito de filmes americanos. O diretor Charles Chaplin (1889-1977), que é de origem britânica, merece o maior número de resenhas de Mário: são seis no total.
Entre elas, uma notável crítica de "O Grande Ditador", "obra grandiosíssima", segundo o escritor -que faz surpreendente interpretação do cinema chapliniano à luz do que ele chama de "miniaturismo inglês".

NO CINEMA

AUTOR Mário de Andrade
EDITORA Nova Fronteira
QUANTO não definido (104 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo


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