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PERSONALIDADE
Músico deixa como testamento a experimental "Dama Tereza", uma parceria com o núcleo Instituto
Sabotage propôs integração do samba ao rap
DA REPORTAGEM LOCAL
Chico Science, Cássia Eller,
Sabotage. É preciso que alguém diga aos mais talentosos artistas da nova música brasileira que tomem cuidado, que parem
de morrer assim tão cedo.
Postado na trincheira funda do
rap, Sabotage era um desses mais
talentosos artistas brasileiros jovens. Músico de rua, cumpriu carreira curtíssima, de um disco
cheio (o vigoroso "Rap É Compromisso", de 2001) e surpreendentes intervenções na trilha sonora do filme "O Invasor" e no
coletivo "Coleção Nacional", do
entusiasmado núcleo paulistano
de produção Instituto. Os dois últimos saíram em 2002; Sabotage
já preparava seu segundo CD.
A trajetória foi crivada de balas
no meio da viagem de transição
entre o lugar comum dos jovens
artistas de periferia (o submundo) e uma possível, futura e utópica invasão criativa na moderna
MPB. A utopia não se cumpriu.
Talvez não se cumprisse, mesmo que ele permanecesse vivo. O
Brasil ainda não aprendeu a incorporar o rap em sua extensa linguagem musical, em parte pelo
próprio hermetismo do quase
sempre americanizado gênero.
Os fãs de Sabotage se localizavam principalmente na comunidade adolescente (de várias classes sociais), o que era um dado
promissor. Mais promissor ainda
era o papel único que começava a
desempenhar dentro do rap
aquele rapaz pobre preto de pitós
armados no cabelo que era capaz
de dançar entre playboys numa
festa MTV, radiante de alegria, ao
som da loira Debbie Harry.
Na faixa "Dama Tereza", de
"Coleção Nacional", Sabotage inventou o que se pode classificar
como o primeiro samba-rap brasileiro. Reinventava a roda, uma
vez que samba e rap, aqui, são irmãos desde a nascença do segundo. "Dama Teresa" era quebrada
como só o rap e suingada como só
o samba. E era poesia bruta, de
crônica cotidiana terna e violenta
entrecortada por inesperadas rimas em "i".
Sabotage e "Dama Tereza"
eram, só isso, promissores. Nesse
sentido, podiam ser um dos rumos de futuro para o rap e para a
MPB. A promessa se descumpriu.
Fica a tarefa para artistas que já
trabalham em direção parecida,
como Rappin" Hood e MV Bill. Fica o germe de reflexão para os homens que deram guarida em sua
gravadora para que Sabotage se
projetasse, também conhecidos
como Racionais MC's.
De volta ao início, é preciso reconhecer que um pedido de cuidado a artistas carentes como Sabotage e seus chapas do "país de
Deus" é mera figura de retórica.
Seu destino estava menos em suas
mãos que nas do Brasil que lhe
concedeu samba e hip hop no pé e
em seguida o largou no relento.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
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