São Paulo, Sábado, 27 de Fevereiro de 1999 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Meninos, voltei
PEDRO ALEXANDRE SANCHES da Reportagem Local Não havia saída. Lado iluminado da sombria moda new wave, que começou a florescer no submundo em 1975, a banda nova-iorquina Blondie não teve alternativa senão voltar, após 17 anos de resistência. "No Exit" (Sem Saída) acaba de ser lançado, no mundo e no Brasil. Por que o beco sem saída? É que, como Deborah (ex-Debbie) Harry -líder e figura-chave da banda loira que ousou aproximar punk, art rock e vanguarda de vulgaridades como rock "na-na-na" e disco music-, 53, não se esforça por ocultar, faltava diversão e um pouco de dinheiro (ou o inverso). Desde o encerramento de atividades do grupo -movido por guerras internas de ego e por uma doença rara de Chris Stein, guitarrista, compositor, parceiro e marido de Deborah- ninguém que tenha passado pelo Blondie conseguiu chegar perto do sucesso que standards pop como "Denis", "Heart of Glass", "Atomic" e "Rapture" obtiveram na década de 70. A própria cantora-líder-estrela chafurdou a partir de 1981 em álbuns solo que nunca conquistaram o mercado, a ponto de ser demitida da gravadora Sire, tão baixas haviam sido as vendagens de "Debravation" (93). O beco não tinha saída senão a meia-volta. "No Exit" traz Blondie em sua formação mais enxuta: Deborah, Chris, Clem Burke e Jimmy Destri -entre 1976 (data de "Blondie", a estréia) e 1982 (quando saiu o -até então- derradeiro "The Hunter"), a banda oscilava entre quatro e seis integrantes. Frank Infante e Gary Valentine, ex-membros não convidados à reintegração, chiaram e atrasaram em alguns capítulos a novela do retorno. Mas não havia escapatória. "No Exit" chega a rigor, produzido por Craig Leon, parceiro dos primeiros anos, e engomado no mesmo formato de rock'n'roll "popificado" que fez do Blondie o patinho feio da new wave. História Blondie nasceu em ambiente e em tempo de underground do underground. No início dos 70, dominavam a cena pop os pomposos do rock progressivo e do hard rock, ameaçados de leve pela endemia glitter que vinha da Inglaterra. A quem não fechava com os pomposos, restavam em Nova York resquícios do reinado do artista plástico Andy Warhol na pop music, via sua associação com a banda Velvet Underground. De entre os "órfãos" de Warhol e os filiados ao glitter rock de além-mar emergiriam futuros punks e new waves -Blondie entre eles. Nascida em Miami, Deborah Harry vinha de coelhinha da Playboy e garçonete de antros como o Max's Kansas City, que fora pouco antes palco e centro aglutinador da trupe Warhol/Velvet. Por lá circulavam outros famintos pela fama, como o futuro fotógrafo Robert Mapplethorpe e sua melhor amiga, a futura deusa new wave Patti Smith. Se o movimento passaria à história como momento de vanguarda/auto-destruição/reconstrução e, por que não?, ultra-romantismo, nem tudo era tão harmônico então. Uma das fontes de tensão era, justamente, a contraposição entre Patti Smith e Debbie Harry. À primeira, cabia o fogo intelectual da geração que se instalava no buraco imundo que era o bar CBGB's, templo da new wave. Em torno dela, dispunham-se poetas simbolistas reencarnados no pop, tipo Tom Verlaine e seu Television ou Richard Hell e seus Voidoids. Debbie, por seu turno, destinava-se a musa de hedonistas, vadios e "sexólatras". Congregava gente a princípio mais despretensiosa, tipo os Ramones e os Talking Heads. Como é de hábito, o lado Blondie foi o único a encarar o sucesso explosivo -e, por consequência, a ser confundido com banda de discothèque, vendida ou ordinária. De fato, o "appeal" de Debbie Harry aproximou-a para sempre das vertentes mais comerciais de pop e rock. Sem sua passagem pela cena, não teria conquistado lugares ao Sol toda uma tradição feminina do pop, numa escalada comercial que parte de Madonna, passa por Cardigans e chega em No Doubt. Os puristas talvez não perdoassem a adesão ao "mainstream" -ou ao sucesso- de Debbie. Esta viu comparsas de primeira hora debandando -Ivan Kral para a banda de Patti, Fred Smith para o Television- e o Blondie sendo tratado como "primo pobre". Mas, como um dos últimos movimentos realmente underground do pop, a new wave tragou seus participantes, de lá ou de cá. Tanto a new wave de Patti como a de Debbie se contraíram. No final dos 90, ambas guardam-se a criar arte no beco sem saída -Patti no eterno underground, Debbie no "no exit" do re-Blondie. Texto Anterior: Filmes e TV Paga Próximo Texto: Volta se faz de confissões, desculpas e cinismo pop Índice |
|