São Paulo, sábado, 27 de março de 2004

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Editora relança seus clássicos na onda da aventura

MARCELO RUBENS PAIVA
ARTICULISTA DA FOLHA

Quando se achava que a literatura tinha dado o último suspiro, "Harry Potter" trouxe uma nova luz ao mercado. Luz e lucro. E fizeram a conta: se há público para Potter, deve haver para outros.
Lembraram-se de clássicos e mais clássicos do mesmo gênero, empoeirados em estantes, escritos antes de Walter Benjamin decretar o fim da narrativa. E agora a editora Record relança a "Coleção Clássicos de Aventura", coordenada por Heloisa Seixas, com novas traduções e projeto gráfico.
Já estão nas livrarias "A Ilha do Tesouro", de Robert Louis Stevenson, e "Ela", de H. Rider Haggard, traduzido por Seixas, autora de livros como "A Porta" (1996).
Em breve, saem do prelo "Robinson Crusoé", de Daniel Defoe, "Ayesha - A Volta de Ela", de Haggard, "Moonfleet", de J. M. Falkner, e "As Viagens de Gulliver", de Jonathan Swift.
Em comum entre eles, escritos há mais de um século, o fato de seus autores virem do Reino Unido, o que leva a uma reflexão: apertados numa ilha, herdeiros de um império em que o sol não se punha, poucos conseguiam contar histórias como eles. Os conterrâneos de Shakespeare criam relatos de naufrágios e não escondem o ímpeto por narrativas que apontam os espantos de encontros entre anglo-saxões e povos ditos primitivos.
O "boom Potter" indicou que a era dos livros não chegara à beira do abismo. Um atalho se construiu: levas de garotos e adultos voltaram a entrar em filas, como no passado, aguardando ansiosamente o lançamento de uma nova obra da inglesa Joanne Kathleen Rowling e de seu concorrente, o sul-africano J.R.R. Tolkien, autor da trilogia "O Senhor dos Anéis". Mas o relançamento dos clássicos indica: nem só com bruxos e anéis se faz uma literatura envolvente.
"A Ilha do Tesouro", de Stevenson, que, aos 40 anos, se mudou para a ilha de Samoa, onde morreu, não é uma história de magia ou de anéis com superpoderes. É de marinheiros bêbados, que perderam membros do corpo na defesa do país do rei Jorge, atolados em rum, pirataria, traição e, como diz o nome, caça ao tesouro.
Jim Hawkins, o menino que narra o livro, cuida da estalagem Almirante Benbow, do pai doente. Vira servente de um dos hóspedes, um verdadeiro lobo-do-mar, "o tipo de homem que tornava a Inglaterra terrível no mar".
Quando morre, o bucaneiro deixa uma dívida na estalagem. O menino e sua mãe resolvem abrir seu baú. Nele, acham um embrulho com o mapa de uma ilha com tesouros que corsários pilharam.
Uma expedição é organizada. Marujos são contratados. A viagem ao desconhecido ganha sentido, uma ilha de 14 quilômetros de comprimento e oito de largura, na forma de um dragão gordo.
Já "Ela" narra uma expedição organizada por dois professores, Leo Vincey e Horace Holly, desta vez pela África, em busca de uma civilização perdida, os Amahagger, liderada por uma mulher imortal, Ayesha, conhecida como "aquela que deve ser obedecida, amada e desejada", que usava surdos-mudos como serviçais.
O autor é mais conhecido por "As Minas do Rei Salomão". Inspirou, entre outros, Tolkien, Freud e Jung, que comparava Ayesha ao mito da sabedoria e beleza, como Ísis e Afrodite. Haggard constrói sua narrativa como um cientista aventureiro. Descreve o que vê, como um naturalista desenha uma espécie nova.


A ILHA DO TESOURO. De: Robert Louis Stevenson. Tradutor: Alves Calado. Editora: Record. Quanto: R$ 39 (352 págs.).

ELA. De: H. Rider Haggard. Tradutora: Heloisa Seixas. Editora: Record. Quanto: R$ 48 (464 págs.).



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