São Paulo, quarta-feira, 27 de abril de 2005 |
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TEATRO Aos 70 anos, autor participa, no Sesc Ipiranga, em São Paulo, de evento que resgata peças que criou com Augusto Boal Guarnieri relembra Zumbi e Tiradentes
VALMIR SANTOS EDU LOBO - O "Arena Conta Tiradentes" tinha músicas de Caetano, de Gil, de Sidney Miller, Theo de Barros e daí por diante. Eram muitos. Enquanto "Arena Conta Zumbi" tinha um autor só. Sem querer desfazer dos outros, era um só com essa grande responsabilidade. O Edu Lobo era fantástico; moçíssimo, tinha acabado de ser premiado no Festival da Excelsior [1965, com "Arrastão", parceria com Vinicius de Moraes e interpretação de Elis Regina]. O melhor mesmo é quando você tem um compositor com o qual se afina, conversa, vai junto, aí é muito legal. O Edu ficou com a gente. Éramos dois tímidos, uma coisa terrível. Eu perguntava: "Dá para tocar?". Ele respondia: "É bom". Ficamos nessa dois dias, até que chegamos a coisas que realmente nos entusiasmaram. PÁTIO DOS MILAGRES - A única
coisa que a gente poderia fazer era
sobre a história brasileira, porque
aí ninguém cobraria, não proibiriam logo de cara. Chegamos à
conclusão de que Zumbi seria
realmente fantástico. Foi o início
de um intercâmbio muito grande
entre nós e os diversos setores das
artes, desde instrumentistas,
compositores, atores, jornalistas,
enfim, eram todos. Parecia que
um fio começava a se juntar.
Aquilo se tornou realmente um
pátio dos milagres, no bom sentido. Vinham pessoas de outros Estados e se juntavam lá no Redondo [bar e restaurante na esquina
da av. Ipiranga com a r. Teodoro
Baima, em frente ao Arena, reduto de artistas e intelectuais]. DOENÇA - É uma insuficiência
renal crônica. Essa aí, ou você fica
fazendo hemodiálise, três vezes
por semana, como eu, ou faz um
transplante. Ainda bem que existe
a hemodiálise, sempre agradeço.
Após quatro anos, sinto-me mais
animado. A doença dá uma depressão terrível, aquele cansaço.
Não é moleza, não. Mas, ao mesmo tempo, não é dizer: "Que terrível, morreu". Morreu o escambau. Está aí e vai em frente, rapaz,
com todo o sorriso de felicidade
que tem. A ciência trabalha com
essas tecnologias todas e, puxa, te
dá um rim novo. Uma injeçãozinha e uma maquininha te viram o
sangue de cabeça para baixo. Estou discutindo com os médicos
para saber se vale a pena tentar o
transplante ou se deixa para lá. REALISMO SOCIALISTA - A questão da transformação, eu acho
que continua. Não escrevo nada
que não vá transformar. Agora,
ao mesmo tempo, não posso me
esquecer daquela tendência à ingenuidade na nossa juventude.
De achar que vai dar tudo certo, é
assim mesmo, ah, não tem galho,
porque a gente sempre termina
ganhando. Depois, percebemos
que não era nada disso. O que
realmente não admito é deixar a
bola cair. Há momentos em que
cai; puxa, tudo é uma bosta. Mas
isso é um momento e, depois, deixa de frescura, bicho, vai em frente. OS PORQUÊS - E tem o lado que
eu me preocupo cada vez mais,
que é com as grandes questões filosóficas, os porquês disso, daquilo. De onde vem a vida? Vou lá saber... Aí começo a rir. Perguntar
para mim mesmo é covardia. E é
lindo você pensar de onde veio e
para onde vai. Eu talvez me preocupe mais para onde vou. Mas sei
que para onde vou terei uma calma. Se você me perguntar se tenho medo da morte, não tenho,
me enturmo com o que vier. Eu
tenho medo do sofrimento. Eu sei
que o que vier vem de bom. OTÁVIO, TIÃO E AGILEU - Para
imaginar esses personagens [de
"Eles Não Usam Black-Tie" e "A
Semente", ambas sob o ponto de
vista dos operários] na atual sociedade brasileira, é preciso colocá-los imutáveis. Seriam daquela
época vivendo hoje. Acho que eles
enlouqueceriam, não agüentariam. Têm coisas sólidas na cabeça, a questão moral. Esses caras
não mudariam nada, possuem
uma ética brutal. |
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