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ANÁLISE
"Glauberianas" tem tom convencional
ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA
O Canal Brasil vem exibindo
uma série sobre o trabalho
de Glauber Rocha na TV no programa "Abertura". O documentário "Glauberianas" peca por um
convencional tom celebrante, que
contrasta -em forma e conteúdo- com a experiência que analisa. "Abertura" foi um programa
semanal de entrevistas dirigido
por Fernando Barbosa Lima e
apresentado entre outros, por
Glauber Rocha, exibido aos domingos à noite, em 1978 e 1979, na
decadente TV Tupi.
Como o título sugere, testava os
limites do processo de liberalização política iniciado por Geisel e
que teria continuidade no mandato do general Figueiredo.
Em "Abertura", Glauber desenvolveu uma linha performática de
atuação-direção que já vinha se
delineando em seu trabalho cinematográfico. No até hoje interditado "Di Glauber", documentário
sobre o enterro de Di Cavalcanti,
Glauber se apresentava por inteiro diante da câmera.
Na TV, Glauber fazia um programa autocentrado, de opinião
forte e explícita, gravado na rua
ou em locações privadas com
uma nervosa câmera na mão. Interagia com um espectro amplo e
variado de pessoas.
Sua festa de 40 anos, repleta de
amigos célebres, é assunto de um
programa. Em outra oportunidade, Glauber dá a palavra a Brizola,
um guardador de carros negro,
homônimo do político, na época
ainda no exílio. A entrevista com
um homem do povo tem como
contrapeso uma amável conversa
com o então governador da Bahia, Antonio Carlos Magalhães.
Em "Glauberianas", fragmentos
dessas interações são intercalados
com depoimentos bem comportados, em cenários anódinos, alinhavados por uma entrevistadora
solícita. A série dissipa a energia
do original.
Vinte e cinco anos depois, em
pleno momento de reflexão sobre
a experiência democrática, não
seria o caso, talvez, de uma reprise
do "Abertura" de Glauber na íntegra?
Esther Hamburger é antropóloga e
professora da ECA-USP
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