São Paulo, quarta-feira, 27 de julho de 2005

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ANÁLISE

"Glauberianas" tem tom convencional

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

O Canal Brasil vem exibindo uma série sobre o trabalho de Glauber Rocha na TV no programa "Abertura". O documentário "Glauberianas" peca por um convencional tom celebrante, que contrasta -em forma e conteúdo- com a experiência que analisa. "Abertura" foi um programa semanal de entrevistas dirigido por Fernando Barbosa Lima e apresentado entre outros, por Glauber Rocha, exibido aos domingos à noite, em 1978 e 1979, na decadente TV Tupi.
Como o título sugere, testava os limites do processo de liberalização política iniciado por Geisel e que teria continuidade no mandato do general Figueiredo.
Em "Abertura", Glauber desenvolveu uma linha performática de atuação-direção que já vinha se delineando em seu trabalho cinematográfico. No até hoje interditado "Di Glauber", documentário sobre o enterro de Di Cavalcanti, Glauber se apresentava por inteiro diante da câmera.
Na TV, Glauber fazia um programa autocentrado, de opinião forte e explícita, gravado na rua ou em locações privadas com uma nervosa câmera na mão. Interagia com um espectro amplo e variado de pessoas.
Sua festa de 40 anos, repleta de amigos célebres, é assunto de um programa. Em outra oportunidade, Glauber dá a palavra a Brizola, um guardador de carros negro, homônimo do político, na época ainda no exílio. A entrevista com um homem do povo tem como contrapeso uma amável conversa com o então governador da Bahia, Antonio Carlos Magalhães.
Em "Glauberianas", fragmentos dessas interações são intercalados com depoimentos bem comportados, em cenários anódinos, alinhavados por uma entrevistadora solícita. A série dissipa a energia do original.
Vinte e cinco anos depois, em pleno momento de reflexão sobre a experiência democrática, não seria o caso, talvez, de uma reprise do "Abertura" de Glauber na íntegra?


Esther Hamburger é antropóloga e professora da ECA-USP

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