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ERUDITO
Formada por jovens músicos israelenses e palestinos, West-Eastern Divan se apresenta em agosto na sala São Paulo
Barenboim traz "orquestra do diálogo" a SP
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Daniel Barenboim, 62, está de
volta a São Paulo. Não trará desta
vez a Sinfônica de Chicago, que
regeu em outubro de 2000. Mas
estará no comando de uma orquestra sinfônica com um lastro
altamente mais simbólico.
Trata-se da West-Eastern Divan, com músicos de 13 a 26 anos
que são israelenses, palestinos ou
de outros países árabes. Há ainda
um grupo de espanhóis da Andaluzia, onde muçulmanos e judeus
conviveram até o século 15.
A orquestra foi criada em 1999,
conjuntamente por Barenboim
-nascido na Argentina, mas cidadão israelense- e o orientalista palestino Edward Said (1935-2003). Ambos também criaram
uma fundação para o ensino musical no território sob controle da
Autoridade Nacional Palestina.
A palavra "divan" que aparece
no nome da orquestra significa
ponto de encontro e, por extensão, também diálogo. É a idéia
central que levou à criação do
conjunto sinfônico para jovens.
Ela interpretará, em sua única
apresentação, no próximo dia 6,
na sala São Paulo, a "Sinfonia
Concertante", para oboé, fagote e
trompa, K. 297b, de Mozart, e a
"Sinfonia nš 1", de Gustav Mahler.
Barenboim, que é também diretor da Staatsoper, de Berlim e que
está deixando a direção da Chicago, uma das "big five" entre as sinfônicas americanas, é ainda um
antológico pianista, com gravações consideradas de referência
em Beethoven e Mozart.
Eis sua entrevista à Folha.
Folha - Quantos músicos o sr.
traz? Qual a nacionalidade deles?
Daniel Barenboim - Serão 96. Entre eles, há 40 israelenses, 40 árabes e 20 espanhóis da Andaluzia.
Folha - Os israelenses predominam em algum naipe?
Barenboim - A repartição é bastante eqüitativa. Nas cordas, metade é de árabes, e a outra, de israelenses. Nos trompetes, são dois
israelenses e um egípcio, clarinetas e oboés são sírios e egípcios, há
um equilíbrio. Além dos palestinos, há músicos também da Síria,
do Egito e do Líbano.
Folha - O governo da Síria não levantou obstáculos para que seus
músicos participassem da orquestra ao lado de israelenses?
Barenboim - O governo sírio foi
informado. Não fez objeção.
Folha - O sr. tem declarado que
não se resolveriam os problemas
do Oriente Médio por meio da música. Qual é então a lógica?
Barenboim - Para mim, a música
é um instrumento de integração.
Integram-se, por exemplo, a harmonia, o ritmo e a melodia, a dinâmica, o fraseado. Os músicos
que trabalham juntos têm o sentimento de integração na diversidade. Por analogia, haverá uma
inspiração para que se integrem
em outros planos.
Folha - Neste ano, o sr. fez uma
conferência em Nova York intitulada "Wagner, Israelenses e Palestinos". Qual a lição a ser dada?
Barenboim - É uma questão
muito complexa. O território da
Palestina foi ocupado durante séculos pelos otomanos. Os ingleses
tornaram-se potência protetora
depois da Primeira Guerra Mundial. Quando os ingleses se foram,
os judeus ali instalados proclamaram o Estado de Israel. Os palestinos permaneceram sob controle
da Jordânia. Os judeus ganharam
uma nova identidade, tornaram-se israelenses. Mas os palestinos
não tiveram sorte idêntica. A criação de um Estado Palestino daria
a eles essa identidade. Mas entre
os israelenses persistem certos tabus. Um deles diz respeito à música de Richard Wagner.
Folha - Por favor, explique melhor essa relação.
Barenboim - Apesar de Israel ser
um país democrático, o tabu que
envolve o nome de Wagner faz
parte da história dos judeus anterior à criação do Estado de Israel.
É como se existisse um neurônio
entre os israelenses que ao mesmo tempo resiste à música de
Wagner e à solução do problema
palestino. São tabus parecidos.
Folha - E o sr. é um entusiasta da
música de Wagner. Já regeu o ciclo
do "Ring" em Bayreuth, não é?
Barenboim - Wagner foi um anti-semita virulento. Mas não é essa a razão pela qual muitos israelenses não gostam dele. É porque
durante o nazismo ocorreu uma
instrumentalização da música dele com finalidades ideológicas.
Mas Wagner não é pessoalmente
responsável. Ele morreu 50 anos
antes que Hitler chegasse ao poder. Se para determinado israelense sua música evoca um período historicamente trágico, essa
pessoa deve ser respeitada. Mas,
numa sociedade democrática, como a israelense, o tabu não deve
ser imposto aos demais cidadãos.
Folha - Falemos da Fundação Barenboim-Said e do ensino da música entre crianças palestinas. Como
elas recebem o repertório de música erudita ocidental?
Barenboim - As coisas se passam
de modo extraordinário. Há uma
enorme quantidade de crianças e
adolescentes com muitíssimo talento. Temos programas didáticos que correm paralelamente. O
talento não depende da nacionalidade da criança.
West-Eastern Divan Orchestra
Quando: sáb., dia 6/8, às 21h
Onde: sala São Paulo (pça. Júlio Prestes
s/nš, centro, tel. 0/xx/11/ 3337-5414)
Quanto: R$ 150 a R$ 300 (R$ 10 para
estudantes até 30 anos)
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