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Verdades e mentiras
Escritor australiano Peter Carey lança romance em que discute falsidade e realidade no ato de criação literária
MARCOS STRECKER
DA REPORTAGEM LOCAL
Pouco conhecido no Brasil, o
australiano Peter Carey, 62, é uma
celebridade do mundo literário
britânico. É um dos dois únicos
escritores a bisar o Booker Prize, o
prêmio literário de maior prestígio do Reino Unido. "Minha Vida, uma Farsa", que agora chega
ao Brasil, é seu último romance,
um thriller ambientado em Londres, na Austrália e na Malásia.
Inspirado num episódio verídico,
sobre um poeta inventado para
desmoralizar uma revista, reflete
sobre a criação literária.
Em entrevista à Folha, feita por
telefone de Nova York, onde mora há 15 anos, Peter Carey conta o
que o motivou a escrever seu romance. Relata sua breve experiência com cinema e explica o que os
prêmios representam na sua experiência de escritor.
Folha - Seu livro é inspirado em
uma fraude literária. Qual foi sua
motivação?
Peter Carey - O que me impressionou na história de Ern Malley
foi que ele nunca existiu, era completamente inventado. Mesmo assim, ganhou vida, e a fraude que
ele representou ainda está viva na
nossa imaginação. Pensei em como seria estar na sua pele. De repente você aparece, com a idade
de 24 anos, e todos acham que você é falso. Como você se sentiria?
Ficaria bravo? Esse personagem
está vivo na imaginação da literatura australiana. Acho que a
maioria dos escritores australianos não apenas pensam nele, mas
gostam dele. No meu livro, no
fim, ele vence. É vingado. Também comecei a pensar na história
de "Frankenstein", de Mary Shelley. Claro, deixei totalmente para
trás a realidade e a história, aquilo
que realmente aconteceu. Inventei circunstâncias. No final, não
há muita coisa da história real, exceto por alguns dos poemas.
Folha - Havia a intenção de ironizar o papel da crítica literária?
Carey - Não foi a minha intenção
inicial. Eu considero as pessoas
que criaram a fraude meus inimigos culturais, pela visão conservadora deles. Não estão do meu lado, pelo menos politicamente.
Acho que a piada que fizeram teve
um efeito muito negativo na sociedade australiana. Tablóides e
jornais da época ficaram felizes
em dizer que arte era bobagem.
Foram vitoriosos no curto prazo,
mas não no longo prazo. No final,
alguns dos poemas que inventaram foram considerados muito
bons. Há universidades dos EUA
que realmente usam esses poemas falsos em seus cursos de literatura. As principais antologias
de poesia australiana incluem os
poemas de Ern Malley. Então a
idéia do livro é de uma vingança
da arte, do risco e do modernismo, o que os fraudadores nunca
imaginaram que poderia acontecer. A personagem que eles criaram era mais importante do que
eles mesmos. Hoje, ninguém lê a
obra deles, mas a de Ern Malley.
Acho isso mais intrigante do que
fazer uma ironia com os críticos.
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