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MÚSICA
Voltam relíquias das décadas de 70 e 80
DA REPORTAGEM LOCAL
Tipo de iniciativa que é cada
vez mais rara no Brasil de hoje, a série "Dois Momentos", da
WEA/Continental, recupera, em
12 CDs de "preço econômico", 22
álbuns dos anos 70 e 80 que andavam esquecidos nos sebos de discos de vinil.
O pacote (leia quadro nesta página) abrange discos de Paulinho
da Viola, Walter Franco, Novos
Baianos, Belchior, A Barca do Sol,
Carlos Dafé, Branca di Neve, Pepeu Gomes, A Cor do Som, Zezé
Motta, Guilherme Arantes, Olivia
Byington. Promete continuar, em
muito breve, com quatro títulos
de Tom Zé em dois CDs.
A série dá continuidade a um
projeto que relançou em um CD,
no ano passado, os dois LPs dos
Secos & Molhados originais. É
conduzido por Charles Gavin,
também membro dos Titãs, banda que acaba de sair da WEA rumo à Abril Music.
Repete-se um caso já comum
nesse tipo de relançamento: a
condensação de dois LPs em um
único CD faz sofrerem os colecionadores, pelas limitações de projeto gráfico, pela feiúra das novas
capas, pelo desprezo aos projetos
originais, pela reunião de trabalhos que não necessariamente
têm maiores conexões.
Gavin tenta contornar tais defeitos, com edições quase decentes, o que não apaga o vinco de
subdesenvolvimento que ancora
essas séries "econômicas" das
gravadoras de cá -podiam fazer
melhor, e por preços ainda baixos, se quisessem realmente; lá fora, os exemplos são abundantes e
constantes.
Isso posto, há um bocado de
coisas importantes no pacote
-algumas das reedições são inquestionáveis.
Walter Franco, por exemplo,
tem seus dois LPs essenciais colocados de novo na praça (eles já
haviam sido relançados em edições melhores, mas tudo bem): os
neoconcretistas "Ou Não" (o famoso disco da mosca, que inclui a
perdedora de festival "Cabeça") e
"Revolver".
Dos Novos Baianos, entram o
terceiro e o quarto LPs, que encerravam a fase mais apegada ao
samba-rock à baiana do grupo.
"Novos Baianos F.C.", em especial, é um clássico.
Belchior é daqueles que têm reeditados dois momentos bem diversos de carreira. Se o LP de 79 é
de sucessos comerciais como
"Medo de Avião", o "Belchior" de
74, seu primeiro álbum até hoje
inédito em CD, é história marginal da MPB. Concretista e altamente indigesto a padrões comerciais (apesar da presença de "A
Palo Seco"), mostra o artista no
auge de seu radicalismo, para o
bem e para o mal. Viva a reedição.
De Paulinho da Viola, os dois títulos dos 80 não estão entre os
mais marcantes de sua carreira
-a WEA prometia o relançamento há anos, mas nunca disse
que seria assim. E "Prisma Luminoso" (83), um tanto mais inspirado que os dois escolhidos, ficou
de fora.
Um segundo setor engloba relançamentos curiosos e de qualidade mais variável. O grupo progressivo/regionalista de rock/
MPB dos 70 A Barca do Sol tem
como curiosidades a produção de
Egberto Gismonti e a participação, entre os membros, do futuro
maestro diluidor Jaques Morelenbaum.
Guilherme Arantes, egresso
também da cultura progressiva,
exibe em dois LPs solo sua "popificação", que deu em resultados
bem conhecidos.
A black music nacional é de novo pesquisada nos volumes de
Carlos Dafé e de Branca di Neve.
O primeiro é o soulman/sambista
de fibra que cravou o hit "Pra Que
Vou Recordar o Que Chorei" (hoje se converteu em pagodeiro alternativo).
Branca di Neve, morto durante
as gravações do aqui presente
"Branca Mete Bronca! Vol. 2"
(89), pertencia à estirpe de samba-rock fundada por Jorge Ben e
reproduzida com brilho por nomes injustiçados como Bebeto (e
ele próprio).
Também em parte ligada a essa
tendência (mas mais próxima ao
samba-soul de Luiz Melodia que
ao samba-rock de Jorge Ben) era a
cantora-atriz Zezé Motta, de carreira musical inconstante desde o
início.
O pacote de Gavin, mais uma
vez, se esquece de um estranho e
pouco conhecido disco de Zezé
Motta em parceria com o ex-Secos & Molhados Gerson Conrad.
Lançado em 75, o LP é uma das
senhas para a interligação das várias modalidades musicais nacionais dos 70 (samba-rock, cultura
hippie, rock pesado). Ficou para
uma próxima.
Entre os títulos de Pepeu Gomes
e A Cor de Som reaparecem as
consequências da cultura hippie
dos Novos Baianos -A Cor do
Som veio de dentro dos NB; Pepeu Gomes, por sua vez, veio de
dentro da Cor do Som.
Por fim, a cantora Olivia Byington aparece também em dois momentos bem distintos, o primeiro
deles (de 78) anterior a sua identificação como cantora da era decadente dos festivais (participou do
"MPB Shell 81" da Globo; aliás,
participou também do festival de
agora).
Está aí um naco do baú ainda
cheio das gravadoras WEA e Continental. Há muito a fazer por eles
ainda (e muito a fazer com mais
capricho e investimento, também). Mas é um começo.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Série Dois Momentos
Lançamento: Warner/ Continental
Quanto: R$ 15, em média, cada CD
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