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ENTREVISTA
O físico brasileiro, autor do best seller "A Dança do Universo", escreve a partir de amanhã no Mais!
Marcelo Gleiser estréia coluna na Folha
MAURÍCIO TUFFANI
Editor-assistente de Ciência
O físico brasileiro Marcelo Gleiser, 38, passa a assinar aos domingos, a partir de amanhã, a coluna
"Micro/Macro", na nova seção
"Futuro" do caderno Mais!. Sua
obra "A Dança do Universo" pulou do quinto para o quarto lugar
no ranking dos livros mais vendidos -gênero não-ficção- do Datafolha em setembro, que o Mais!
apresenta amanhã.
Formado em física pela Universidade Federal do Rio de Janeiro,
Gleiser obteve seu doutorado pela
Universidade de Londres e, desde
1991, leciona física teórica no Dartmouth College, em Hanover, uma
das mais conceituadas instituições
de ensino e pesquisa dos EUA.
Em 1994, o físico fez parte de um
seleto grupo de jovens cientistas
que receberam, cada um, US$ 500
mil do governo dos EUA para seus
projetos de pesquisa. Até junho do
próximo ano, Gleiser deverá estar
no Laboratório Nacional Fermilab, em Batavia, perto de Chicago,
de onde deu entrevista à Folha,
por telefone.
Folha - Seu estudo tem sido interpretado como religioso. Você
concorda com isso?
Marcelo Gleiser - Não concordo. Eu tenho, na verdade, falado
muito sobre o papel da religiosidade no processo criativo do trabalho científico, e não sobre o que seria sua influência na atividade da
pesquisa. Conheço vários pesquisadores que são religiosos no sentido mais ortodoxo dessa palavra.
Mas eles, sejam judeus, católicos
ou muçulmanos, não misturam
sua fé com a pesquisa.
O que eu tenho ressaltado é a religiosidade que esteve presente em
toda a história na inspiração de vários cientistas. Newton, por exemplo, foi uma pessoa extremamente
religiosa. O mesmo acontecia com
Kepler, que descobriu as leis do
movimento dos planetas. Einstein
falava do sentimento religioso cósmico, que, para ele, era o que motivava as pessoas a fazerem ciência.
Quando falo que tenho uma atitude religiosa, me refiro a uma atitude de meditação, de tentar desvendar os mistérios da natureza.
Folha - Por que o curso ministrado por você é chamado de "Física
para Poetas"?
Gleiser - O nome correto da disciplina é "Entendendo o Universo
da Física através dos Tempos".
Nela eu apresento a evolução dos
conceitos da física sem recorrer ao
instrumental matemático. Ela é
voltada para alunos de outras
áreas, como ciências sociais, letras
e filosofia, que normalmente não
têm um treino matemático.
Eu trato os conceitos da física
desde os gregos, na Antiguidade,
até os dias de hoje, com a mecânica
quântica, a relatividade, o Big
Bang e a física de partículas elementares. "Física para Poetas" é
uma denominação que geralmente é dada para diversos cursos em
que a abordagem tem um certo lirismo, sem exigir a matemática.
Folha - Como os cientistas vêem
sua forma de divulgar ciência?
Gleiser - Com relação à divulgação científica, os cientistas podem ser divididos em dois grupos.
O primeiro seria o dos pesquisadores que são extremamente céticos
sobre qualquer iniciativa de divulgação científica, porque, quando
se tenta divulgar ciência para o publico não especializado, existe o
risco de comprometer o significado dos conceitos científicos.
Sempre poderá existir uma certa
deturpação porque, ao traduzir as
idéias científicas, não estará sendo
usada a linguagem adequada. E,
como se diz, toda tradução é uma
traição. Sempre se poderá perder a
precisão dos significados. Isso é
inevitável. Por isso, há muitos
cientistas que são contra esse tipo
de apresentação.
Eu pertenço a outro grupo -que
não é nada pequeno e inclui pesquisadores importantes-, que é o
dos cientistas que fazem um esforço no sentido contrário, que é o de
traduzir, em uma linguagem acessível, os conceitos complicados da
ciência. Mesmo que isso seja difícil
e incompleto, esse esforço deve ser
feito por causa da importância social da ciência.
Quando se faz um investimento,
sempre há um risco e uma margem
de lucro. O risco é o quanto se poderá comprometer o significado
das teorias. A margem de lucro é o
quanto as pessoas vão entender de
ciência. Quanto maior é o risco,
maior tende a ser a perda. Assim,
quanto maior for a exigência de
preservar a rigidez do discurso,
menores serão as chances de as
pessoas aprenderem ciência.
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