São Paulo, sexta-feira, 27 de outubro de 2000

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TEATRO/CRÍTICA
Peça mostra idealismo perdido

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Há 17 anos, assisti a primeira montagem de "Feliz Ano Velho". Não porque gostasse de teatro, mas porque o livro de Marcelo Rubens Paiva era o assunto da época (a professora havia mandado ler o texto). Além do mais, um amigo, primo da Lilia Cabral, que estava no elenco, descolou um ingresso.
"Feliz Ano Velho" foi um livro importante na minha adolescência e para a geração de teens no início da década de 80. O livro falava de tudo que jovens gostam de ouvir e aproveitar: sexo, droga e rock'n'roll. Mas falava de algo mais forte: da vida real. Pode ter muita fantasia lá, mas é de momentos muito concretos que ela surge, e era bacana a gente poder se identificar com literatura. Finalmente, depois de tanta Capitu, cortiço e etc., alguém escrevia sobre uma realidade que não parecia filme em preto-e-branco. É, "Feliz" foi o primeiro livro em tecnicolor que eu li.
Além do mais, falava de um Brasil de que não se falava muito, da tortura, do exílio.
Por isso o livro de Marcelo Rubens Paiva foi um divisor de águas, introduziu o pop na literatura. Se ele quis ou não, isso é outra história, mas ele falou da ditadura ao Bamba, o tênis. Era a história de um cara de verdade que, um dia, entre outras coisas, deu um salto maluco. Mas ele tinha muita coisa em torno dele para contar. Não era ficção ingênua para adolescente, mas uma vida romanceada, com drama, ironia, política.
Lembro que saí fascinado da encenação de "Feliz" no palco. Ia além do livro, não era literal. Tinha circo, música, não era chato. Além do mais, tinha o Marcos Frota, que era igualzinho ao Marcelo que eu imaginava.
Pois bem, "Feliz Ano Velho" tem nova montagem no Tuca. De novo o Marcos Frota (como Marcelo) e a Denise Del Vecchio (como a Eunice, mãe do Marcelo).
Bom, tanto tempo depois a peça está aí com o mesmo frescor. Uma montagem arrojada e simples, com direção de Paulo Betti, que dá espaço para os atores darem seu recados, o que é muito bom em teatro. E eles aproveitam isso bem. Não só Frota, tão jovial e energético como há 17 anos, mas também com ótimos novos atores, como a Maria Ribeiro e o André Frateschi.
Eu não me lembro das projeções que agora existem, cenas de "Jango", do Silvio Tendler. Elas auxiliam na caracterização mais política da peça, que Alcides Nogueira, há 17 anos, já buscava equilibrar com a história de Marcelo Rubens Paiva. Acho necessário ver este espetáculo. Ele fala de um idealismo que hoje faz falta. Talvez soe um pouco careta para os adolescentes de agora, afinal, ninguém mais usa Bamba como forma de protesto.


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