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"O DESAPARECIDO"
Discípulo de Tsai troca claustrofobia por "tempo real"
DA REDAÇÃO
Lee Kang-sheng era apenas
um garoto de rua. Pelas mãos
de seu mentor, Tsai Ming-liang,
ele se tornou ator (dos bons) e encarnou uma versão oriental de
Antoine Doinel -o alter ego de
Truffaut no corpo de Jean-Pierre
Léaud- (no marcante "Que Horas São Aí?", exibido na 26ª Mostra). Sua estréia na direção, com
"O Desaparecido", promete
transformá-lo em forte candidato
a número quatro do Olimpo cinematográfico de Taiwan.
Da convivência com Tsai (de
quem foi o ator-fetiche em todos
os filmes), Lee aprendeu não só a
dirigir atores, mas também a filmar. Em "O Desaparecido", uma
avó perde o neto num parque e
passa o filme inteiro percorrendo
atônita as ruas de Taipé chamando pelo garoto. Em paralelo, um
adolescente tenta localizar o avô
também desaparecido. Em meio
às situações, a cidade aparece assombrada pelo medo da Sars.
Em vez do espaço claustrofóbico dos filmes de Tsai, Lee filma
nas ruas, em longos planos-sequência (sem corte), atingindo o
que se considera "tempo real" da
cena (e, por consequência, a angústia das situações).
Os gritos da avó, que repete o
nome do neto de ponta a ponta do
filme, funcionam como um mantra. É quase como um negativo da
incomunicabilidade entre as pessoas nos filmes de Tsai. Só que
aqui, em vez da mudez, é ao chamado que também nada (ou ninguém) responde.
Ao final, Lee abre o plano e
mostra uma belíssima metáfora
dessa situação, a de um espaço comum, em que todos estão, mas no
qual ninguém mais se encontra.
Curioso é descobrir como esses
cineastas do Oriente assumiram a
tarefa de usar o cinema como forma maior de expressão da vida no
mundo contemporâneo. Em filmes baratos, difíceis e arrojados,
os cineastas de Taiwan (mas também os da Coréia do Sul) realizam
análises impressionantes do nosso mal-estar. Pois sentimentos de
perda e de evasão, de deriva e de
deslocamento não são exclusivos
dos habitantes das metrópoles
orientais, claro.
Como então, no Ocidente (com
exceção, talvez, do extraordinário
novo cinema argentino) os cineastas parecem pensar que essa
questão se esgotou, se o Oriente
nos mostra com tanta acuidade
uma imagem do nosso pesadelo
na tela-espelho?
Em tempos de crise do humano,
como já nos ensinaram os artistas
do neo-realismo, é preciso reaprender a ver para voltar a crer.
(CÁSSIO STARLING CARLOS)
O Desaparecido
Bu Jian
Adeus, Dragon Inn
Bu San
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