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DANÇA
Marcada pela fisicalidade e pela expressão dos gestos, companhia americana se apresenta pela primeira vez no Brasil
Elisa Monte explora a relação com o tempo
INÊS BOGÉA
ENVIADA ESPECIAL A NOVA YORK
Está pela primeira vez no Brasil
a Elisa Monte Dance Company.
Criada em 1981, por Elisa Monte e
David Brown, a companhia pratica uma dança marcada pela fisicalidade, associada à grande capacidade expressiva dos gestos, num
repertório que combina passos
clássicos e modernos.
A sede da companhia fica em
Manhattan, num estúdio que é
também a casa da coreógrafa. Para Monte, 59, não faria sentido ir
"para o trabalho" -a dança é sua
própria vida.
Seu nome hoje está associado a
uma dança de alta qualidade, em
que "o movimento não deve ser
só demonstrativo, mas sim expressar um significado". Na temporada brasileira, serão vistas algumas peças que marcaram sua
carreira, como "Treading" (1979),
com música do pioneiro minimalista Steve Reich, onde Monte explora a influência do Oriente, em
especial a relação com o tempo:
"É o tempo da potencialidade, em
que não somos homens e mulheres, mas as energias masculina e
feminina, que se atraem".
A peça foi criada quando Monte
ainda era a primeira bailarina da
companhia de Martha Graham
(1894-1991) e logo se tornou um
sucesso de público e crítica. Em
1980, Alvin Ailey (1931-89) convidou Monte para recriar "Treading" para sua companhia. "Essa
foi praticamente a primeira peça
que coreografei, e Ailey generosamente a incluiu no repertório de
sua companhia."
Na temporada, a companhia
mostrará "Run to the Rock"
(1998-99), que aborda "a habilidade de encontrar a si mesmo e a coragem de encontrar o significado
da vida". A coreografia usa a versão da cantora Nina Simone para
uma canção gospel. "Shattered"
(2000), com música de Michael
Gordon, tematiza a necessidade
de "encontrar a direção, mesmo
nos momentos difíceis". E "Light
Lies" (2002) é uma homenagem
ao pintor Josef Albers, onde Monte procura captar "a nossa luz e a
vibração das cores".
Folha - Como descreveria a sua
dança em termos do movimento?
Elisa Monte - A cada peça que
crio, busco um novo vocabulário,
uma nova linguagem. O aspecto
escultural é muito importante para mim, levando à dramaturgia.
Que mais? A forma do corpo se
estende para a forma do espaço
pela projeção do movimento.
Folha - O que mais lhe marcou no
trabalho com Graham?
Monte - A personalidade. Ela me
ensinou a perceber os indivíduos
criativos e me deu a determinação
de continuar. Eu já a conheci com
80 e muitos anos. Mesmo assim,
tinha de lutar muito para continuar com a companhia. Aqui nos
EUA é muito difícil continuar na
dança: você começa lutando e
nunca pára.
Folha - E Ailey, como você o encontrou?
Monte - Eu o encontrei em um
espetáculo de [Jiri] Kylián. No intervalo, me disse que sabia da minha coreografia e queria ver. Tive
muita sorte: ele encomendou
mais duas peças.
Folha - Qual o papel da companhia de Ailey hoje nos EUA?
Monte - É uma das principais
companhias. A primeira companhia de negros que teve grande reconhecimento. Isso é muito importante também politicamente.
Folha - Qual o seu legado?
Monte - O espírito negro da dança. Com seu jeito aberto, Ailey
também ampliou a gama de coreógrafos que trabalharam para
seu grupo. E ele conseguiu que
seu grupo fosse muito popular, o
que é raro na dança.
Folha - Qual a maior facilidade e a
maior dificuldade de ter uma companhia em NY?
Monte - Facilidades: acesso à informação, qualidade dos dançarinos, variedade de manifestações
artísticas. Dificuldade: sobreviver.
Folha - Qual o papel do artista,
para você?
Monte - A arte nos mostra a
complexidade e a maneira de viver de um povo. Desse ponto de
vista, acho que os políticos estão
cometendo um grande erro aqui
nos EUA. Não entendem a parte
essencial da sociedade -que é a
cultura. É o que nos singulariza, o
que une os homens e conta a nossa história. Não penso que os políticos estejam realmente dando o
suporte necessário à cultura.
Elisa Monte Dance Company
Quando: amanhã e sáb., às 21h, e dom.,
às 18h (em São Paulo, no teatro Alfa); dia
31, às 21h (em Salvador, no teatro Castro
Alves); dia 1º/11, às 21h (em Aracajú, no
teatro Tobias Barreto)
Quanto: R$ 30 a R$ 120
A crítica Inês Bogéa viajou a Nova York a convite da Dell'Arte
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