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LIVROS
Romance explora conflitos da mãe de assassino mirim
Cartas ao ex-marido revelam crime, suas conseqüências e rejeição da mãe ao filho
Para Shriver, tiroteios nas escolas acontecem por contágio; adolescentes buscam publicidade na TV, nos jornais e na internet
Lefteris Pitarakis - 7.mar.2007/Associated Press
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A escritora americana Lionel Shriver, 50, vencedora do Prêmio Orange 2005 pelo romance "Precisamos Falar Sobre Kevin"
EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL
"Precisamos Falar Sobre Kevin" (Intrínseca; R$ 49,90, 464
págs.), não é mais um livro sobre o horror dos tiroteios em
escolas americanas. O romance, que em 2005 deu à (até então) desconhecida americana
Lionel Shriver, 50, o prestigioso Prêmio Orange, exclusivo
para escritoras, funciona mais
como um tratado de uma depressão pós-parto com causa.
Sua protagonista, Eva, escreve cartas para o ex-marido
Franklin, em que levanta dúvidas sobre vocação maternal,
importância de filhos no casamento e o peso da criação parental quando um adolescente,
o Kevin do título, assassina sete
colegas, uma professora e um
funcionário de sua escola.
Em entrevista à Folha, Shriver conta que o romance surgiu
da interseção de suas próprias
dúvidas quanto à maternidade
e crimes como o de Columbine,
em 1999. Terminado o livro, ela
preferiu não ter filhos. Leia a
seguir trechos.
FOLHA - Os conflitos da maternidade são o tema principal do livro?
LIONEL SHRIVER - Quando comecei a escrevê-lo, achei que seria
mais sobre o fenômeno dos tiroteios. Mas descobri que estava mais interessada na experiência da maternidade, seus
potenciais aspectos adversos e
desafios. E queria abordar o assunto de modo mais realista do
que a maior parte da ficção até
então havia feito. Na literatura,
esta relação em geral aparece
sentimentalizada. "...Kevin"
tecnicamente é um livro sobre
tiroteio numa escola. Mas o que
fez o livro alçar vôo, especialmente no Reino Unido, onde
vendeu 600 mil cópias, foi mais
a questão da maternidade...
FOLHA - No livro, você explora a
idéia de rejeição ao filho, como algo
até plausível...
SHRIVER - Nas culturas ocidentais, a idéia de uma mãe que não
gosta de seu próprio filho é intrinsecamente ofensiva. Falei
com vários pais que, de modo
geral, amavam seus filhos. Mas
passaram por momentos em
que não os amavam, estavam
decepcionados, vivendo períodos de antagonismos. Quando
se tem uma literatura que constantemente sentimentaliza essas relações, acho que é um alívio achar um livro que representa algumas das reais dificuldades e desafios da maternidade e da paternidade. Algo que
vai além da ilusão de crianças
felizes em volta da mesa.
FOLHA - Que papel suas próprias
dúvidas quanto à maternidade tiveram ao escrever o livro?
SHRIVER - O momento da minha vida em que considerei
mais seriamente tê-los foi
quando estava escrevendo este
livro. Tinha 40 e poucos anos,
fisicamente era provável que
ainda pudesse ter filhos, mas o
tempo estava passando. E isso
tornou a questão da maternidade mais urgente no livro. Acho
que no momento em que eu
terminei de escrever já havia tirado a idéia de vez da cabeça.
Funcionou como uma terapia.
Não espero que funcione assim
também para quem estiver lendo. Mas acontece que as ansiedades que eu experimentei em
relação à maternidade não são
uma exclusividade minha. Futuros pais também se preocupam com a perda de identidade,
perda de tempo e dúvidas se
vão ou não se dar bem com seus
filhos e em que medida você é
responsável pelo que seu filho
vem a ser...
FOLHA - Como um assassino, no
caso de Kevin?
SHRIVER - Eu tentei chegar a um
mínimo possível de respostas.
Mas acho que é óbvio o efeito
do contágio desses casos. Não
acredito que as crianças tiram a
idéia do nada. Elas tiram umas
das outras. As notícias nos jornais, na televisão e na internet
são o veículo para o contágio.
Quando você observa a proporção da atenção que deram para
o tiroteio em Virginia Tech
[abril de 2007], foi na mesma
escala que Columbine. Parece
uma espécie de encenação.
Acho que a cultura americana
está tão orientada para celebridades de qualquer tipo, que
ninguém mais parece se preocupar pelo que se é famoso. E é
relativamente mais fácil conseguir uma arma e sair atirando
em sua escola... É preciso ter
um pouco de coragem e planejamento. Mas você não precisa
trazer paz ao mundo ou fazer
uma grande descoberta em física... Claramente toda esta publicidade inspira parte dos adolescentes a imaginar a si mesmos tendo este tipo de atenção.
Provavelmente porque parte
desta publicidade vem com
uma solidariedade implícita.
Há muitas pessoas que se sentem negligenciadas e mal-entendidas. E, para elas, expressar simpatia com esses meninos é algo que as dignifica...
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