São Paulo, quarta-feira, 27 de novembro de 2002

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CRÍTICA

"No Vermelho" dramatiza fracasso

XICO SÁ
FREE-LANCE PARA A FOLHA

A "era FHC" chega ao fim com um programa de TV parecido com o seu resultado, esse "No Vermelho" que estreou no domingo na Record. Um "game show" comandado por José Luiz Datena, cujos concorrentes tombaram na competição real da economia e agora tentam sair do buraco em uma aposta de auditório. São vítimas do desemprego, arruinados por dívidas, que tentam limpar o nome a todo custo.
Nome limpo na praça, como diz uma participante da estréia, é o único patrimônio do pobre. As narrativas dos concorrentes levam ao choro, para transbordar ainda mais o vale de lágrimas que virou a televisão domingueira.
"Não sei se você vai chorar?!", antecipa o próprio apresentador antes de mostrar as desgraças. Faz assim uma agiotagem emocional para apresentar vidas afogadas em juros na lama do SPC.
A diferença do novo programa é que Datena não atribui o desemprego a forças do além ou castigos do Senhor, como as ruínas sociais costumam ser tratadas por outros apresentadores. É direto ao culpar o governo.
Com um discurso afetivo e supostamente solidário -não seria esta a melhor receita de populismo?-, no qual tenta parecer sempre em auxílio aos concorrentes, o apresentador reserva qualquer dureza (a "marvada" mão invisível do mercado) a uma voz em "off", austera mediadora na contagem de ponto e julgamento dos participantes.
A aposta na jogatina -um tabu nos sermões evangélicos dos donos da emissora- tem também "Roleta Russa", nas noites de quinta, com Milton Neves. Ao contrário de Datena, ele faz a linha dura, quase sadomasoquista, e se diverte ao mandar para um buraco, um fosso mesmo, concorrentes que fracassam em respostas a perguntas na linha "Show do Milhão".
"Essa é a parte que eu mais gosto", diz o apresentador, cinismo ensaiado, no momento da queda.
O programa é bem dirigido, a corrida é milionária (R$ 500 mil), mas é pouco depender apenas de um buraco como grande apelo. Somente Silvio Santos, com um pacote de dinheiro na mão e alguns miseráveis à frente, consegue há décadas esse milagre.

No Vermelho



   
Onde: Record, domingo, 19h

Roleta Russa



  
Onde: Record, quinta, 22h30



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