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CINEMA
"A Via Láctea" trata a cidade como personagem
São Paulo surge "em plena forma" no novo longa de Lina Chamie
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
Um grande amor não vai morrer assim, num telefonema encerrado sem despedidas. É o que decide Heitor, 42, quando ouve de
sua jovem namorada, Júlia, 22,
que o fim chegou -do sentimento e da relação.
Heitor (Marco Ricca) resolve ir
até Júlia (Alice Braga) e disso decorre "um corpo-a-corpo com
São Paulo, que invade a tela em
plena forma, com suas belezas e
feiúras", como descreve a cineasta
Lina Chamie.
Na história desse imaginário
professor de literatura, mais exatamente em seu "mergulho em
direção ao destino amoroso",
Chamie ancora "A Via Láctea".
Este é o primeiro filme da diretora após a estréia com "Tônica
Dominante" (2001). Não deixa de
ser amoroso o olhar que ela lança
sobre São Paulo, em que pese a
presença do trânsito que não anda, da miséria estacionada nos sinais e da violência que acossa os
motoristas.
No roteiro, assinado por Aleksei
Abib e pela própria diretora -filha do poeta Mário Chamie-, a
literatura muitas vezes é contraste
à aridez da paisagem e meio de
tradução dos afetos dos personagens.
Um trecho: "De volta ao trânsito. Heitor olha os carros parados
ao seu lado. Em seguida, vê um livro jogado no banco de passageiros. Angustiado, abre o livro mecanicamente. Em close, o título da
página: "Na doce calma dos teus
braços'".
Mergulhar a câmera em São
Paulo e apostar no tom "semidocumental" para seu filme foi uma
decisão de Lina em parte determinada pelas contingências.
"Não tenho dinheiro para fazer
meu engarrafamento de 50 carros", diz a diretora. Limite imposto, a equipe agora capricha na torcida para que os corriqueiros
"pontos de retenção" no trânsito
paulistano coincidam com o percurso de Heitor pelas ruas.
(Leia no quadro abaixo as regiões da cidade em que "A Via
Láctea" está sendo filmado.)
Engarrafamento
Lina produziria seu próprio engarrafamento se houvesse conseguido o orçamento original estimado para o filme (cerca de R$ 1
milhão). Mas, em dois anos e
meio de tentativas, não ultrapassou os R$ 430 mil, obtidos num
concurso estadual.
"Até certo ponto, a espera é
criativa. Depois, não", diz Lina,
demarcando o fim de outro sentimento -não o amor, mas a paciência. O tom da cineasta, no entanto, não é de reclamação. "Estou feliz. Estou filmando. E exatamente com os atores que queria."
Quando Marco Ricca e Alice
Braga dizem que quiseram muito
fazer este filme, a afirmação não
soa como a mecânica ladainha
dos atores que exaltam os projetos em que se envolvem.
No ar na novela "Bang Bang"
(das 19h, na Globo), gravada no
Rio de Janeiro, Ricca anda fazendo malabarismos na agenda para
filmar em São Paulo.
"Não faço mais cinema se quem
me convida não tiver paciência de
me agüentar como um colaborador. Gosto de um roteiro em que
não estejam todos os códigos",
afirma ele.
Produtor e ator de "Crime Delicado", quarto longa do cineasta
Beto Brant, com estréia prevista
para janeiro de 2006, Ricca se prepara para dirigir seu primeiro filme, também no ano que vem. A
história ele ainda não comenta,
mas o cenário será São Paulo.
"Aprendizado"
Alice -a "cocota" de "Cidade
de Deus", que atualmente está em
cartaz entre os amores de Lázaro
Ramos e Wagner Moura em "Cidade Baixa"- tem planos de fazer um parêntese na (meteórica)
carreira de atriz de cinema para
estudar interpretação.
Adiou a idéia porque avaliou
que "trabalhar com Lina seria um
aprendizado". Alice também quis
contrapor à prostituta Carina de
"Cidade Baixa" uma personagem
como a veterinária Júlia, "segura,
decidida, que sabe o que quer".
Entre um filme e outro, Alice
atuou na produção internacional
realizada no Brasil "The Journey
to the End of the Night", ao lado
do rapper Mos Def. Ricca acaba
de filmar, com Cacá Diegues, "O
Maior Amor do Mundo", em que
seu personagem aparece dos 30
aos 68 anos de idade. "Foi fácil.
Estou no meio [das idades]", diz.
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