São Paulo, sexta, 27 de novembro de 1998

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MÚSICA
Claudinho e Buchecha


Duas duplas do Rio lançam CDs de black music que devem gerar os hits que devem grudar nas paradas em 99


PAULO VIEIRA
especial para a Folha

As chances de ascensão social dos ex-office-boys, ex-camelôs e ex-favelados Claurcirlei de Souza e Claudio Rodrigues de Mattos, nascidos no Morro do Salgueiro, em São Gonçalo (Rio), não eram muitas. Mas, quando, há pouco mais de dois anos, uniram-se sob os pseudônimos Claudinho e Buchecha, criaram umas coreografias estranhas e adotaram uma pronúncia "Meriti" para yes, nunca mais saíram do topo de execução e vendagem de discos no Brasil.
Claudinho e Buchecha lançam agora o terceiro CD, "Só Love", -750 mil cópias já chegaram às lojas. A faixa-título é hit de verão certeiro e já toca no país. A dupla recebeu a Folha em São Paulo.
Folha - Vocês aparecem de terno na capa do CD. Influência do Luxemburgo ou do Alexandre Pires?
Buchecha -
É que a dupla é bastante descontraída, de vez em quando é legal fazer um estilo sério. Mas nos shows não é assim, nosso figurino é mais street.
Folha - Falei do Alexandre Pires porque a música que fecha o CD é um pagode tipo Só Pra Contrariar.
Buchecha -
Todo CD da gente tem um sambinha. Temos planos de lançar um dia "os melhores pagodes de Claudinho e Buchecha".
Folha - Verão passado vocês participaram do "Luau", da MTV, só com violão e voz. Dá para imaginar a dupla em shows acústicos?
Buchecha -
Agora o Claudinho está tocando violão de verdade, naquele "Luau" era enganação. A gente vê Titãs, Paralamas em acústicos, mas eles têm décadas de carreira. Temos muito para aprender.
Folha - Vocês citaram uns bairros de São Paulo no disco, mas no final é o Rio que sai por cima.
Buchecha -
É uma coisa original da gente, dizem: "Poxa, você não falou da minha favelinha". Os compositores falam de Copacabana, da "Garota de Ipanema", jamais vão fazer a garota do Borel.
Folha - Vocês ainda moram em São Gonçalo?
Buchecha -
Não, no Rio.
Folha - Vocês foram a São Gonçalo em outubro para um show, mas houve um tumulto e saíram correndo. O que aconteceu?
Claudinho -
Não sabemos o que aconteceu. Quando estávamos subindo no palco, começou um corre-corre e decidimos sair fora também. Não houve show, mas distribuímos alimentos.
Folha - Quem organizava a festa, algum traficante local?
Buchecha -
Não, nós mesmos. Temos ainda o alvará, estava tudo certinho. Era um show beneficente de Dia das Crianças.
Folha - Há pouca mensagem social nas letras de vocês, exceto a que pede paz nos bailes funks.
Buchecha -
Acho que o pessoal já sofre, e há grandes compositores nessa área, os Racionais etc. Acho válido falar de amor para distrair. A gente já morou em favela, sofreu. Nem por isso somos revoltados.
Folha - É difícil um favelado se destacar, como foi com vocês?
Buchecha -
As oportunidades são pequenas, mas, se você ainda dificulta, fazendo coisas erradas, aí que elas não aparecem nunca. Acho que as pessoas têm que ter paciência. É o que pedimos, para pararem de brigar. E que as crianças estudem, não trabalhem.
Folha - O rap americano, e mesmo aqui no Brasil, ataca muito a polícia, que em geral é muito malvista nos bairros mais pobres. Vocês não se importam com o tema?
Claudinho -
A gente se importa, mas já existem pessoas que falam disso. Nossa prioridade é levar as coisas boas. Se todo mundo ficar martelando o lado ruim, piora.
Folha - O que os Racionais fazem não é legal?
Claudinho -
Não foi isso que eu disse. Tem que haver os dois lados, também o da pessoa que abre os olhos do seu próximo. Dizem que os Racionais pregam a violência, mas não é verdade. Eles falam do risco das drogas, fazem conscientização. A gente procura mostrar o outro lado da moeda, o amor, as coisas maravilhosas da vida.
Folha - No CD, o Buchecha agradece a professora. Que professora?
Buchecha -
De canto. É difícil nos aturar. A gente procura sempre descontrair, e existem ambientes para se resguardar um pouco mais. Ela foi muito paciente.
Folha - Com o Claudinho a professora deve ter tido mais paciência, por causa da língua presa.
Claudinho -
É, em algumas músicas fica difícil, mas a gente vai vencendo com a força de vontade.



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