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TELEVISÃO
Que nos queixemos ao bispo
TELMO MARTINO
Colunista da Folha
O progresso é grande. A TV
Record finalmente possibilitou a
todos que se queixem ao bispo.
Muito paciente, o bispo ouve horas de queixas e lamentações pela
madrugada adentro. Isso acontece no programa "Fala Que Eu Te
Escuto". E como falam os queixosos nessa oportunidade que ganharam para expor seus infortúnios. São males que quem canta
não mais espanta. Isso porque o
programa em questão é sobre erros médicos.
A pergunta quer descobrir o
culpado dos erros médicos: "Médico, hospital ou fatalidade?". A
fatalidade é logo eliminada. Os
médicos ganham numa disparada de lamúrias, embora no decorrer das queixas os hospitais estejam sempre por perto.
A primeira mulher a se queixar
exibe um festival de cicatrizes.
São resultados de operações malfeitas e desnecessárias que a incompetência dos médicos retalhou. Esses horrores não são vistos
apenas por quem está em casa.
Advogada e médicos estão lá, sentados, ouvindo palavras que lhes
são rotineiras.
Quando contam casos tenebrosos de pessoas que se sentiam protegidas com seus planos de saúde,
a vontade é correr para a TV Globo para ver que tal é o filme que
rola por lá. Mas, horror por horror, é melhor ficar com a verdade.
Até certo ponto. O susto deve ser
maior para as mulheres em idade
de constituir família. Tudo indica
que, no Brasil, os maiores erros
são cometidos no campo da obstetrícia. As fotos que mães mostram de seus filhos assustam os
notívagos que se dispõem a fazer
companhia ao bispo. São notívagos masoquistas. Até a revistinha
que a Ana Maria Braga publica
pode ser um inferno menor. Talvez. Mas aí não se saberia que em
erros médicos, entre os obstetras
brasileiros, tem a Tanzânia como
companheira em número de casos. O Brasil é bacana. Tem a humildade de não querer fingir uma
vantagem dentro do seu grupo.
Humildade? É isso o que o dr.
Monteleone (jamais confundir
com Brancaleone) considera a
qualidade que nenhum médico
competente pode desprezar. Uma
pobre vítima de erro médico mostra a foto de seu filho com paralisia cerebral devido à demora que
sofreu para ser atendida na hora
do parto. Essa demora impediu
que ela fizesse a cesária, tão indispensável em seu caso.
Uma senhora volta-se logo contra o dr. Monteleone, com seu visual de médico dos filmes da extinta Metro-Goldwyn-Mayer. "O
senhor é contra a cesária. Viu o
que aconteceu?" Todo digno, dr.
Monteleone disse que é contra o
exagero nacional dessa prática,
que em países ricos e sensatos é
infinitamente menor. Mas não dá
mais para escutar os que falam.
"Nós não temos como nos defender", dizem eles. É cruel, mas nós
temos um simples botão.
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