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BIOGRAFIA
A Janis Joplin por trás do pôster
CYNARA MENEZES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Entre as revelações que a norte-americana Alice Echols faz sobre
Janis Joplin na biografia que escreveu sobre a cantora, uma é
particularmente chocante e nada
tem a ver com drogas, sexo ou
rock and roll: Janis passou seus
curtos e intensos 27 anos de vida
dividida entre ser uma superstar
da música ou se casar, ter dois filhos e uma casinha de cerquinha
branca.
Para o leitor, é um espanto associar aquela Janis enlouquecida,
eletrizada e provocante que nos
acostumamos a ver nos pôsteres
de época, ou a mulher liberada
que abriu os palcos do rock para o
sexo feminino, à ex-adolescente
com problemas de peso e acne,
insegura e sedenta por aceitação,
que vem à tona em "Janis Joplin:
Uma Vida. Uma Época".
Janis nasceu em Port Arthur,
uma cidade industrial do Texas
que chegou a ser nomeada pela
revista "Business Week" como
"uma das dez cidades mais feias
do planeta". A futura blueseira, a
princípio menina bem-comportada, logo se tornaria uma espécie
de "Carrie, a Estranha" do colégio: rejeitada, ridicularizada, vítima de fofocas. O negócio era mesmo sair dali.
A primeira parada é uma cidade
vizinha, logo Los Angeles, depois
Austin, já começando uma carreira musical, mas com a "outra Janis" sempre forçando uma volta
para casa em busca da aceitação
familiar, que nunca veio.
É incrível descobrir que Janis
Joplin, famosíssima após vender 1
milhão de cópias de "Cheap
Thrills", seu segundo disco, de
1968, "quando os jornalistas da
"Time" e da "Life" se digladiavam
para entrevistá-la", ainda fosse
capaz de perguntar a sua mãe se o
"Port Arthur News" tinha escrito
alguma coisa a seu respeito. "Em
caso positivo, mande para mim",
teria dito. Seis semanas antes de
morrer de overdose, em 1970, ainda tinha ido à cidade para uma
festa de reencontro de seus antigos colegas, e sido mais uma vez
rejeitada pela família.
Também parece inacreditável
que a intérprete de "Summertime" ou aquela "loira com voz de
negão", como diz Rita Lee no prefácio, pudesse ser insegura ao
ponto de entrar em crise cada vez
que aparecia uma cantora nova
no cenário norte-americano, com
medo de as pessoas descobrirem
que "não sabia cantar".
Essas duas Janis também disputariam a sexualidade da roqueira:
a da "cerquinha" era, claro, heterossexual, mas a estrela da música
também gostava de mulheres.
Embora aponte os casos homossexuais que Janis teve ao longo da
vida, Alice Echols, rejeita, porém,
o rótulo de gay para ela. "Ela acreditava em viver fora das categorias, em vez de encriptada por
elas. Nesse aspecto, foi uma regressão ao modelo boêmio de
ambiguidade sexual", defende.a
autora no livro.
Echols é uma especialista em
história dos anos 60, e aproveita a
escusa de biografar Janis para
contar o que acontecia na cena
musical do período, sobretudo
em San Francisco, a partir da introdução da guitarra elétrica no
folk, sob influência da música britânica, em 1965. A autora também
fala de comportamento, mostrando uma certa desilusão com a geração hippie e, sobretudo, com o
abuso de drogas por seus representantes.
Algumas vezes prolixo, noutras
excitante, com o defeito óbvio das
biografias superadjetivadas produzidas nos EUA, o livro não responde, e sim deixa perguntas sobre Janis: quem foi exatamente?
Por que morreu? Por que parece
não ter sido amada? Seria feliz em
sua desejada casinha de cerquinha branca?
O título original da biografia é
"Scars of Sweet Paradise" ("Cicatrizes do Doce Paraíso"), extraído
de uma canção de Bob Dylan que
dizia: "Se você não acredita que há
um preço para este doce paraíso,
só me lembre de te mostrar as cicatrizes". Janis Joplin pagou o
preço e mostrou as cicatrizes, mas
não dá para perceber onde estava
o doce paraíso em sua vida.
Livro: Janis Joplin: Uma Vida.
Uma Época
Autora: Alice
Echols
Tradutora: Marcela Cosenza Silva
Editora: Global
Quanto: R$ 38 (347 págs.)
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