São Paulo, sábado, 28 de fevereiro de 1998

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DISCO LANÇAMENTO
Goldie faz drum'n'bass autobiográfico

SÉRGIO MARTINS
especial para a Folha

É "Saturnz Returnz", de Goldie. Mas pelo seu cartão de visitas (leia-se a autobiográfica "Mother"), a obra poderia muito bem passar como rock progressivo. A canção tem todos os defeitos das bandas do gênero: pretensão, pompa e erudição de cartilha "caminho suave".
"Mother", uma "sinfonia drum'n'bass", retrata o período em que Goldie passou no orfanato. Deve ter sido difícil, pois ouvir 60 minutos de lamentos, cordas e pouquíssimas batidas (a primeira delas só depois de 20 minutos de audição), é uma tortura pior do que a executada pelos donos do orfanato em "Oliver Twist".
Os primeiros acordes de "Truth", que também traz vocais pouco inspirados de David Bowie, são suficientes para se duvidar do suposto talento de Goldie. E dar razão àquela crítica preconceituosa da "Rolling Stone" - que chamou o DJ de "o Emerson, Lake & Palmer da geração drum'n'bass".
Quando termina o primeiro CD (são dois), a vontade é de amaldiçoar Björk e Naomi Campbell. A primeira por entupir Goldie com música clássica. E Naomi porque, com aquela deusa de ébano ao lado, deve haver outras coisas melhores para fazer do que compor.
Mas eis que chega "Temper Temper". Outra canção autobiográfica, em que Goldie fala de seu temperamento irascível, soa como se Lemmy Kilmister (do Motorhead) tomasse um ecstasy. Goldie grita feito um alucinado e derrama baterias infernais sobre nós, enquanto Noel Gallagher bota a guitarra para apitar - e às vezes chega ao limite do heavy metal.
"Digital" tem como convidado especial o rapper KRS-One e propõe uma fusão entre o rap e o drum'n'bass. Com resultados bastante satisfatórios, diga-se.
"I'll Be There for You" é a canção que faz "Saturnz Returnz" valer a pena. Remete aos princípios do gênero, quando o drum'n'bass tinha batidas mais soturnas.
O Brasil -que Goldie dedica "de coracao"- é tema para outras duas músicas do álbum. A primeira, "Dragonfly", tem frases em português e um clima brasileiro. E "Chico - Death of a Rock Star" é dedicada a Chico Science, com direito à guitarra de Lúcio Maia e co-autoria dada a Jorge Mautner (autor de "Maracatu Atômico", cuja guitarra foi sampleada).
Entre mortos e feridos, esse está longe de ser um disco ruim. Porém não é melhor do que "Timeless" (95) e muito menos justifica a fama de gênio de Goldie.
Ao lado de trabalhos mais inovadores como "New Forms" (de Roni Size & Reprazent, este sim, essencial) e as coletâneas "Platinum Breaks 1 & 2" (formada pelos DJs da Metalheadz), "Saturnz Returnz" serve apenas como aperitivo para uma noitada regada a drum'n'bass com batidas mais frenéticas.


Sérgio Martins, 30, é editor da revista "Showbizz"

Disco: Saturnz Returnz Artista: Goldie Lançamento: PolyGram Quanto: R$ 36, em média


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