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Escritos mostram projeto de identidade nacional
MAURICIO PULS
da Redação
Os escritos de José Bonifácio de
Andrada e Silva (1763-1838) reunidos no livro "Projetos para o Brasil", recém-lançado pela Companhia das Letras, revelam um político que procurava conciliar a manutenção da monarquia com a implantação de reformas sociais capazes de construir uma identidade
nacional.
Entre os textos reunidos por Miriam Dolhnikoff, pesquisadora do
Cebrap, destaca-se o projeto apresentado à Assembléia Constituinte
no ano de 1823, que propunha a
extinção do tráfico negreiro em
"quatro ou cinco anos" e a emancipação gradual dos escravos -temas que muitos dos críticos liberais da época não admitiam nem
mesmo colocar em debate no Legislativo.
Outro projeto seu defendia que
os índios não mais fossem esbulhados de suas terras, "de que são
legítimos senhores, pois Deus lhas
deu". Também pregava uma reforma agrária, com o confisco das
terras improdutivas.
Todas essas medidas eram necessárias, segundo ele, para construir um Estado nacional moderno e homogêneo.
Progressista
Uma análise de sua biografia
mostra que os aspectos progressistas de seu pensamento não
eram elementos incompatíveis
com seu conservadorismo político.
José Bonifácio nasceu em Santos, no ano de 1763, filho de um
rico comerciante local. Estudou filosofia e direito na Universidade
de Coimbra (1783-1788), da qual
se tornaria catedrático de metalurgia em 1801, após prolongados estudos na França, Alemanha e Suécia.
Ocupou diversos cargos de relevo na burocracia estatal: intendente-geral das Minas e Metais do
Reino, diretor do Real Laboratório
da Casa da Moeda, superintendente de Alfândega e Marinhas.
Membro da Academia de Ciências
de Lisboa desde 1789, tornou-se
seu secretário em 1812 -um sinal
de seu prestígio entre a intelectualidade.
Fortemente influenciado pelo
Iluminismo, Bonifácio integrava o
grupo de ilustrados lusitanos que,
seguindo a trilha aberta pelo marquês de Pombal, tentavam reformar e modernizar o Império.
Quando retornou ao Brasil em
1819, estava distante de qualquer
pretensão nacionalista e considerava-se um súdito do império português, desejando apenas que a
sua terra natal adquirisse um estatuto de igualdade com a metrópole.
Em 1820, porém, ocorre a Revolução do Porto, que visava substituir o regime absolutista por uma
monarquia constitucional. O novo
regime pretendia porém anular
todas as vantagens concedidas ao
Brasil após 1808, reconvertendo o
país numa colônia de Portugal.
Essa política recolonizadora se
chocava diretamente com a posição de José Bonifácio. Chefia então a delegação paulista que, em
janeiro de 1822, pede a d. Pedro
que desobedeça as ordens das
Cortes de Lisboa, ficando no país.
No mesmo dia, d. Pedro o nomeia
ministro do Reino e dos Estrangeiros.
Torna-se um dos principais articuladores da Independência, defendendo um governo forte (no
que se opunha aos liberais), mas
constitucional (o que o incompatibilizava com os absolutistas).
Criticado por uns e outros, acaba entrando em choque com o imperador, e deixa o ministério em
16 de julho de 1823. "Todo governo em revolução só faz descontentes", escreveria mais tarde, admitindo que os dias de sua gestão
"não foram sempre puros".
Assume uma cadeira na Assembléia Constituinte, enquanto seus
adeptos lançam o jornal "O Tamoio" -nome que indicava sua
oposição aos portugueses que cercavam o imperador. Insatisfeito
com o projeto, d. Pedro 1º fecha a
Constituinte em 12 de novembro.
Nesse mesmo dia Bonifácio é
preso e, dias depois, exilado para a
França: "Se Pedro fosse um déspota como Frederico, capaz de ilustrar e felicitar o Brasil, talvez lhe
perdoasse a sua ingratidão para
comigo; mas a um pérfido cruel, e
perjuro, sem caráter e nobreza
d'alma, oh Deus, isso não".
É do seu exílio na França que datam a maior parte de suas anotações sobre a política. O livro contém ainda diversas observações
sobre o país ("os brasileiros mostram altivez nas baixezas,
amor-próprio nas bagatelas e obstinação em puerilidades"), sobre
economia e política ("o governo
deriva da propriedade, e não vice e
versa") e literatura ("as nossas
glosas nunca passarão os Pireneus").
Livro: Projetos para o Brasil, de José
Bonifácio de Andrada e Silva
Organizadora: Miriam Dolhnikoff
Editora: Companhia das Letras
Preço: R$ 23,00
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