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REFORMA AGRÁRIA
Governo financia documentário sobre assentamento fundiário, mas proíbe sua exibição comercial
Incra 'engaveta' vídeo sobre invasões
LUIZ ANTÔNIO RYFF
da Reportagem Local
Os problemas fundiários que dão
tanta dor de cabeça ao presidente
Fernando Henrique Cardoso chegam às telas do Brasil. Ou melhor,
não chegam.
O Incra (Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária)
não libera a exibição comercial do
documentário "Sonho de Rose",
dirigido pela cineasta Tetê Moraes
com verbas do órgão público.
Oficialmente, o Incra não ficou
satisfeito com o resultado do vídeo
e vetou sua distribuição ou exibição comercial.
O diretor de assentamentos do
Incra, Aécio Gomes de Matos, reconhece que o problema é político.
E a decisão também.
Segundo Matos, o vídeo mostra
como é um processo de invasão.
"O filme fala do sucesso das invasões. O Incra não poderia assumir
essa visão no presente momento."
Afinal, no mês passado, milhares
de participantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra) marchava sobre Brasília.
Filmado no ano passado, o vídeo
mostra como estão e vivem os personagens do documentário "Terra para Rose", realizado pela mesma Tetê, há uma década, na fazenda Annoni, no Rio Grande do Sul
-local de uma das primeiras
grandes invasões no campo.
"Não é que o filme seja subversivo. Ele retrata um pedaço da realidade. Mas o filme tem a cara da autora. Não tem a visão do Incra",
justifica Matos.
"Não é um trabalho panfletário,
nem propagandístico do MST",
diz Tetê. "Mostro que o assentamento dá certo com a participação
do Estado. Há cenas de técnicos do
Incra no assentamento", afirma.
"Todos vão muito bem. Eles
deixaram uma situação marginalizada e se transformaram em pequenos produtores rurais. Hoje, o
assentamento tem 400 famílias e é
altamente produtivo", diz Tetê.
Ela lamenta que a proibição seja
motivada por "uma questão de
momento". "Isso é um desgaste
político para o próprio governo."
Com a proibição do Incra, o vídeo
só pode ser mostrado em festivais e
em sessões especiais. "Eu me sinto
uma 'sem-tela'", lamenta a cineasta.
Domínio público
O Incra financiou o vídeo. Por
contrato, ele deveria consumir R$
150 mil -de verba pública-, ter
cerca de 45 minutos e ficar pronto
em quatro meses. Segundo Tetê
Moraes, ele demorou nove meses
para ser realizado, com o dobro do
custo e de duração.
Para isso, ela teve que desembolsar o resto do dinheiro. "Eu tenho
cabeça de jornalista, de cineasta,
não de burocrata", diz Tetê. Mas,
por contrato, os direitos de propriedade e distribuição são exclusivos do Incra.
É essa cláusula contratual que ela
quer revogar, já que o documentário ficou pronto, mas o Incra não
tem mais interesse em distribuir o
vídeo e não libera sua exibição comercial.
A cineasta quer que sua obra seja
vista e, com isso, pretende recuperar o investimento feito.
Segundo Matos, foi aventada a
hipótese de o Incra ceder seus direitos para a cineasta e desvincular
seu nome da produção.
"Mas conversamos com a área
jurídica e essa possibilidade poderia caracterizar malversação de
verbas públicas."
"É preciso ter uma compromisso com as regras do jogo. A opinião pessoal não é necessariamente a mesma da instituição", diz
Matos. Tetê quer autorização para
buscar outros investidores, transformar o vídeo em filme e recuperar o dinheiro investido. Mas o Incra não concede a autorização.
A solução proposta pelo Incra é
tornar o copião do vídeo domínio
público e doá-lo a uma instituição
pública. Quem se interessar poderá usar o material da forma que
quiser. "Assim não estamos beneficiando ninguém e damos uma
contribuição à arte", diz Matos.
A saída irrita a diretora. "É um
absurdo. É um material autoral. E
eu estou viva. Se for assim, a Rede
Globo ou a UDR, por exemplo,
podem pegar o vídeo e editar da
maneira que quiserem, com um
enfoque diferente do original."
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