São Paulo, sexta-feira, 28 de junho de 2002

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CINEMA/ESTRÉIA

Chega às telas brasileiras "Lilo & Stitch", longa-metragem de animação que subverte o padrão Disney de contar histórias

O fim da fantasia

Reuters
Walt Disney, criador dos estúdios que deram vida ao Mickey Mouse e que agora estréiam "Lilo"


SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A ORLANDO

Ele é o único Disney a ainda trabalhar nos estúdios criados por seu tio no século passado. De certa maneira, Roy Disney, 72, é a reserva moral dos ideais defendidos pelo pai do Mickey Mouse.
Segundo a lei não-escrita do genial e polêmico Walt Disney (1901-1966), os maus são maus, os bons são bons e não há lugar para meias tintas em suas produções. Além disso, os valores da família tradicional devem ser louvados, e o final, sempre feliz.
Pois foi justamente o vice-presidente do quadro de diretores da Walt Disney Company e presidente da divisão de longas-metragens de animação que deu o sinal verde para a produção de "Lilo & Stitch", nova animação dos estúdios, que estréia hoje no Brasil.
Isso não seria notícia, já que a empresa coloca nas telas pelo menos um longa do gênero por ano. Acontece que o anárquico "L&S" está mais para "Shrek", do principal concorrente DreamWorks, do que para "Fantasia" e "Bambi", que fizeram a fama da casa.
Em "L&S", que se passa numa ilha do Havaí, o herói é mau-caráter e a heroína, uma menina revoltada e resmungona. No final mais ou menos feliz, a nada tradicional família é formada pela dupla, mais a irmã mais velha da garota, seu namorado e um agente do governo americano.
Roy Disney falou à Folha sobre a inusitada decisão da empresa:

Folha - Este é certamente o mais anti-Disney dos filmes Disney. Por que o sr. o aprovou?
Roy Disney -
Eu sou o malvado, o sujeito que diz não. Muitas vezes tenho de falar para os artistas: "Você pode colocar isso no filme, sim, desde que tenha cuidado com a atitude". Artistas são artistas e querem ser livres...
Não há idéias proibidas, apenas prestamos atenção na atitude. Você pode contar a mesma piada de vários jeitos diferentes, e em um deles vai parecer que a piada é suja e desrespeitosa, e contada de outro jeito é perfeitamente aceitável. Quando me propuseram a história de Lilo e Stitch, me assustei, mas falei para irmos em frente, mais para ver o que daria. E deu certo, adorei o resultado.

Folha - Não o incomodou o fato de o filme apresentar uma família não-tradicional?
Disney -
Sim, mas o fato não aparece como uma questão moral, e sim como um acidente: os pais da menina morreram num desastre de carro. Não existe nenhum conto de fadas que não comece com um terrível acidente ou que não tenha uma criança órfã.
A madrasta da "Branca de Neve" queria matá-la ou contratar alguém para matá-la. O Bambi perdeu a mãe, e isso afetou muitas pessoas. O Rei Leão perdeu o pai, o Dumbo também sofreu. Isso fala às crianças, pois reflete o medo primal delas, de perder os pais.
Quando era pequeno, vivia nos corredores dos estúdios e me lembro de ver a cena em que Branca de Neve corre sozinha na floresta e as árvores tentam agarrá-la. A versão era p&b, sem música nem nada, e vi apenas 20 ou 30 segundos da cena, mas aquilo me amedrontou pelo resto da vida!

Folha - O futuro da animação tende mais para "Shrek" e "Lilo" ou continua na direção de "Bambi" e "A Bela e a Fera"?
Disney -
A resposta a esta pergunta é "sim". O mundo está aberto para a animação, e temos a habilidade de fazer qualquer coisa e usar qualquer estilo e qualquer combinação de estilos que a gente quiser e que tenha a ver com a história que estamos contando.

Folha - Walt Disney não gostava de continuações. O estúdio tem feito várias...
Disney -
Walt não era fã de continuações. Mas pouca gente sabe que ele tentou fazer uma sequência, durante a Segunda Guerra, de "Branca de Neve". Era para usar os personagens numa propaganda antinazista. Ele não faria uma continuação só pela bilheteria.


O jornalista Sérgio Dávila viajou para Orlando a convite da Disney


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