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São Paulo, sábado, 28 de junho de 2003

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Contemporâneo do cinema novo, diretor fez obra oposta ao movimento

Morre Walter Hugo Khouri, o cineasta da contracorrente

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

O cineasta Walter Hugo Khouri morreu na madrugada de ontem, aos 74 anos, vítima de um infarto, em sua casa, em São Paulo.
Autor de 27 filmes, Khouri foi velado na Cinemateca Brasileira, que suspendeu suas atividades. O enterro estava previsto para as 9h de hoje, no cemitério São Paulo.
A carreira de Khouri foi marcada pela controvérsia com o movimento do cinema novo, nos anos 60, do qual foi contemporâneo, mas discordante.
Enquanto os cineastas cinemanovistas buscavam rompimento de linguagem, quebrando cânones estilísticos e assumindo engajamento político, Khouri retomava tradição clássica e industrial representada pelas produções da Vera Cruz. Com o irmão William Khouri, chegou a assumir a gerência do acervo dos estúdios.
"Khouri tem a importância de ser uma referência contemporânea ao cinema novo, mas alternativa a ele. Talvez a personalidade cinematográfica própria e consistente que construiu ao longo do tempo tenha sido ofuscada justamente por surgir no mesmo momento em que aparecia o cinema novo", diz o cineasta André Klotzel, que estudou a obra de Khouri em curso com o crítico Paulo Emílio Salles Gomes, na Escola de Comunicações e Artes, na USP.
O crítico Jean-Claude Bernardet é exemplo desse embate. "Minhas relações com Khouri foram bastante tensas, porque eu estava mais ligado ao cinema novo, e ele considerava que as pessoas do cinema novo eram seus inimigos e poderiam transformá-lo em vítima", afirma.
Mas crítico e cineasta conviveram e travaram inúmeras discussões sobre cinema, frequentemente ambientadas num bar na rua Dom José Gaspar, como lembra Bernardet. Khouri também recebeu o crítico em alguns de seus sets de filmagem.
"Devo a ele parte da minha aprendizagem. E mesmo não sendo pessoalmente grande admirador de sua obra, considero "Noite Vazia" um filme indiscutivelmente importante", afirma Bernardet.
Realizado em 1964 e estrelado por Norma Bengell e Odete Lara, "Noite Vazia" é um expoente na filmografia de Khouri. Filmado em preto-e-branco, narra a perambulação de dois homens (Gabriele Tinti, Mário Benvenutti) numa única noite paulistana, em que saem em busca de prazer. Os dois encontrarão a companhia de Bengell e Lara.
"Ele tinha um viés de filmar o mal-estar da burguesia paulista", afirma Alain Fresnot, que ganhou de Khouri seu primeiro emprego. "Junto com [a cineasta] Ana Carolina, fiz a continuidade de "As Amorosas", em 1967. Eu tinha 16 anos", diz Fresnot.
Notório por acolher e apresentar jovens profissionais, Khouri foi também o primeiro a escalar a apresentadora Xuxa Meneghel num longa -"Amor, Estranho Amor" (1982). O filme acabou sendo alvo de disputa judicial. A apresentadora requereu a interdição de suas exibições.
O cineasta Sérgio Bianchi afirma que "Khouri não parecia ter ficado muito machucado pelas mágoas daquela época [refere-se às disputas com os cinemanovistas] e conseguiu produzir quilos de filmes, o que é uma glória".
De acordo com a família de Khouri, o cineasta atravessava processo depressivo nos últimos tempos. O infarto o atingiu às 5h, quando tentava ir do quarto à sala de seu apartamento.


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