São Paulo, terça-feira, 28 de junho de 2005

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ARTES PLÁSTICAS

Exposição em Nova York reúne 80 trabalhos do século 19 feitas lado a lado pelos dois artistas

MoMA casa obras de Cézanne e Pissarro

HOLLAND COTTER
DO "NEW YORK TIMES"

Os sinos de casamento tocam novamente no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA). Dois anos atrás, Matisse e Picasso se uniram lá; antes deles foram Picasso e Braque. Anteontem, quando foi inaugurada a exposição "Pioneiros da Pintura Moderna: Cézanne e Pissarro" iniciou-se mais uma lua-de-mel.
Durante cerca de uma década em meados do século 19 Cézanne e Pisarro trabalharam freqüentemente lado a lado. Esse período é o foco da mostra de 80 quadros, reunidos por Joachim Pissarro, curador do departamento de pintura e escultura do MoMA e bisneto de Pissarro.
Os dois artistas provinham de fora da cultura dominante francesa. Pissarro, nascido na ilha caribenha de St. Thomas, era filho de um negociante judeu. Estudou na França, mas somente depois de voltar a St. Thomas, e então passar dois anos na Venezuela, se estabeleceu de vez na Europa, tornando-se pintor.
Cézanne era de Provence, no sul da França, e também sofria sob as expectativas da família. Enviado a Paris para estudar direito, ele teve aulas de pintura em uma escola de Paris. Ali conheceu Pissarro, que era nove anos mais velho e tornaram-se amigos.
Formavam uma dupla marcantemente estranha. Cézanne era um desajustado furioso, com rosto de hobbit, mente de acadêmico e boca de estivador. Pissarro era sério, paciente, mas radicalmente contra o autoritarismo. Quando perguntado sobre o modo de fazer a arte francesa progredir, disse: "Queimar o Louvre".
O que os artistas compartilhavam era ambição e propósitos elevados. Como pintores heterodoxos, tinham pequena chance de sucesso nos salões patrocinados pelo Estado. Então faziam o que queriam: seguiam o caminho da maior resistência. Eles transformaram a exclusão em independência, e a independência num imperativo moral inabalável.
Paradoxalmente, a maior diferença inicial entre os dois era sua arte. "As Margens do Marne no Inverno" (1866), de Pissarro pode não parecer tão ousado hoje, mas foi uma grande conquista para o pintor. Ali está a simplicidade do plein air de Daubigny; e também a futura geometria de Mondrian.
A pintura correspondente de Cézanne também de 1866, um retrato de seu pai em tamanho quase natural, está a um mundo de distância: é assustadoramente claustrofóbico, com a tinta espalhada a espátula. Cézanne pai se equilibra numa poltrona instável. Um banqueiro politicamente conservador segura um jornal de esquerda que jamais seria visto lendo. Uma natureza-morta de seu filho errante está pendurada sobre sua cabeça.
Os artistas aprenderam com suas dessemelhanças. Cézanne começou a fazer mais paisagens e a experimentar com a geometria. Pissarro pegou uma espátula e enlouqueceu um pouco. Eles se tornaram uma espécie de coletivo de dois, trocando informações e alternando papéis.
Dois quadros de 1877 (veja ao lado), de um pomar na aldeia de Pontoise, oferecem grandes contrastes entre as pinturas dos artistas. O grupo de árvores de Pissarro é uma miragem, trazida à vida com pinceladas curtas e rápidas, enquanto o de Cézanne é feito de manchas de cor emplastadas.
A mostra foi montada de maneira que permite examinar essa ação superficial de perto, como os artistas teriam feito, um olhando por cima do ombro do outro.
No final da década de 1870, a ligação entre os artistas começa a se diluir. E quando Pissarro teve um curto e sério flerte com o neo-impressionismo, Cézanne, sempre disposto a sentir-se traído, fechou a porta da amizade, sem fechá-la para a arte inicial de Pissarro, com a qual continuou aprendendo.


Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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