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TEATRO
Atriz volta à cena com uma personagem, Patty Diphusa, que ela diz ser a "síntese" de tudo que já fez
Christiane Tricerri leva Almodóvar ao palco
NELSON DE SÁ
da Reportagem Local
A "vedete" Christiane Tricerri,
38, agora mãe de Isadora, 1 ano e
quatro meses, está de volta a seu
personagem preferido. Se tudo der
certo, ela retorna ao palco no mês
de outubro, dirigida por Marília
Pêra, no papel de Patty Diphusa,
uma estrela de fotonovelas pornô
transformada em diva de revista
pós-moderna.
É uma personagem do cineasta
espanhol Pedro Almodóvar, criada em textos esparsos durante os
anos 80, reunidos em livro em 91
(ed. Martins Fontes, 92).
A atriz foi achar Patty Diphusa
quando deixou o Ornitorrinco,
grupo dirigido por Cacá Rosset e
do qual ela fez parte por mais de
uma década. A gravidez adiou um
pouco a produção, mas não cortou
a vontade.
"A Patty Diphusa é a síntese de
tudo o que eu fiz", diz ela. "É um
ícone do consumo, uma atriz de
fotonovelas reconhecida internacionalmente, segundo ela. É a inspiradora do Andy Warhol. A arte
pop não existiria sem ela. E ela
nunca dorme, porque dormir significaria a morte."
A atriz vai relacionando coincidências com a personagem, como
o fato de que fez fotonovela, no papel de Mara Tara, criada pelo cartunista Angeli.
"Foi nos anos 80 também", diz,
"e até hoje eu sou reconhecida por
causa dessas fotonovelas, por uma
moçada. A Mara Tara era crítica,
era agressiva".
A coincidência maior é que, sem
chegar aos extremos da personagem, Christiane Tricerri também
vê certa ironia crítica na nudez que
marcou toda a sua carreira no palco -que acaba de completar redondos 20 anos.
O comediante Ary França, que
também foi do grupo Ornitorrinco, dizia de Christiane que ela tinha "corpo maravilhoso, mas uma
cabeça que atrapalha".
A atriz, que se formou em direção teatral na Escola de Comunicação e Artes da USP, escreveu a
adaptação para teatro de "Patty
Diphusa e Outros Textos", o livro
de Almodóvar, e obteve a aprovação do cineasta.
Mandou o texto para Marília Pêra, que teria concordado em dirigir. No elenco, além dela, Ricardo
Castro, Milhem Cortaz e Mila Ribeiro, como parte de uma nova
companhia chamada La Nave
-também o nome da revista em
que Patty/Almodóvar publicou
suas "memórias".
"Nua, não"
Se a cabeça "atrapalha" ou não, o
certo é que o corpo de Christiane
Tricerri esteve descoberto em quase todas as peças de que participou. Uma exceção talvez seja, é o
que ameaça a atriz, "Patty Diphusa". "Ela não aparece nua, não",
diz, "mas esta é uma questão para
resolver depois".
A atriz vai relatando sua carreira,
em "síntese". Em sua primeira peça, com 17 para 18 anos, uma montagem de "Equus" que permaneceu dez meses em cartaz, ela já estava sem roupa. "Eu me lembro
que meu pai nem quis ver, porque
eu estava nua", diz rindo. "Nua
completamente."
A primeira peça profissional veio
já nos anos 80, "O Mal Secreto".
"Eu era assassinada. Nua também.
Mas o Sábato (Magaldi, crítico) me
elogiou." Depois veio "Bella Ciao".
Seu personagem, Lucchina Buona
Gamba, Lucchina "boa perna",
rendeu prêmio de melhor atriz da
associação de críticos.
Começou então a longa fase do
Ornitorrinco, com espetáculos de
repercussão como "Ubu", de Alfred Jarry, que ficou anos em cartaz, "O Doente Imaginário", de
Molière, "A Comédia de Erros", de
Shakespeare.
Foi quando Christiane Tricerri
trouxe um livro da Itália, "Il Segreto della Commedia Dell'Arte", e
passou até a dar palestras sobre como a mulher foi introduzida, finalmente, no teatro.
"Os atores da comédia italiana
viram que não tinham mais público", conta ela, "e foram atrás dos
vendedores ambulantes, passaram
a andar com eles. Eles abriam baús,
tiravam coisas coloridas, e tinham
mulheres para ajudar a vender, lindas mulheres, que atraíam. E os
atores levaram então a mulher ao
palco. Foi aí, na commedia dell'arte. Que depois dominou o teatro
por quatro séculos."
O momento maior de sua carreira no Ornitorrinco -e, de certa
maneira, também de sua nudez-
foi "Sonho de uma Noite de Verão", de Shakespeare. Christiane
Tricerri estreou nua no Central
Park, em Nova York, no verão, e a
montagem causou furor nos tablóides da cidade.
Acabou na "Playboy" americana
como um dos momentos "sensuais" do ano -ao lado de Madonna e Cicciolina, o que ela conta
com orgulho, mais por Cicciolina
do que por Madonna. Recebeu
uma oferta da "Playboy" brasileira, mas recusou.
Indecisa quanto à nudez em
"Patty Diphusa", a atriz já tem outra papel na cabeça. "Eu tenho
uma tradução de "Salomé", que eu
mesma fiz e vou interpretar. E eu
vou fazer "A Megeda Domada".
Mas depois eu quero tragédia."
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