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"THE LAST EMPIRE ESSAYS 1992-2000"
Ensaios de Gore Vidal devassam o império e sua política
AMIR LABAKI
ARTICULISTA DA FOLHA
Há oito anos Gore Vidal
venceu o prestigiado National Book Award americano com
"United States Essays 1952-1992"
(Estados Unidos Ensaios 1952-1992), um catatau de 1.300 páginas reunindo 140 textos sobre cinema, política, história, literatura
e, claro, Gore Vidal. É provável
que seja esse, mais que qualquer
de seus romances, o volume que
lhe garanta um lugar no panteão
dos homens de letras dos EUA do
século 20.
Comparado à primeira coletânea, o recém-publicado "The Last
Empire Essays 1992-2000" (O Último Império Ensaios 1992-2000)
mais parece um posfácio expandido. Contam-se 48 ensaios, resenhas e cartas publicados desde o
aparecimento de "United States"
até janeiro deste ano.
Além da evidente superioridade
estrutural da primeira antologia,
o Gore Vidal de "The Last Empire" parece mais repetitivo e dogmático, ainda que na maioria dos
textos não faltem a argúcia e a inquietude esbanjadas em "United
States". Tudo somado, Vidal continua a ser um dos maiores ensaístas em atividade. Nada mais
natural, assim, que mais uma vez
busque a aproximação com o
mestre do gênero nos EUA, celebrando Edmund Wilson ("Rumo
à Estação Finlândia") desta vez no
ensaio de abertura ("Edmund
Wilson, Homem do Século 19").
Como Wilson, o Vidal maduro
tempera cada texto com toques
autobiográficos. "Ele dá certamente o seu melhor", escreve Vidal de Wilson, "quando ele volta
suas luzes para uma figura literária a quem conhecia e então como
que caminha em torno dela".
Os ensaios de "The Last Empire" foram todos escritos sob o signo de Edmund Wilson (1895-1972). A tese básica de Vidal, a dos
EUA como "o último grande poder global" numa era de crescente
"irrelevância" do "Estado-nação"
como o forjado pelo capitalismo
moderno, é um desenvolvimento
quase em linha reta de um dos
textos mais polêmicos e menos
conhecidos de Wilson, "The Cold
War and the Income Tax" (A
Guerra Fria e os Impostos, 1963).
Nele, Wilson vinculava o aumentos dos impostos pessoais nos
EUA do pós-guerra, em contraste
com a declinante contribuição relativa das empresas, à voracidade
do complexo industrial-militar
justificado internamente pelo
"Grande Satã" (Vidal) soviético.
O autor do recente "A Era Dourada" (Rocco, 512 páginas, R$ 41)
reconhece a dívida explicitamente
no ensaio que empresta título à
nova antologia, publicado originalmente no recentemente revigorado "Vanity Fair" em novembro de 1997. "Desde 1941", elabora
Vidal, "quando Roosevelt tirou-nos da Depressão, bombear dinheiro federal em rearmamento,
em tempos de guerra ou não, tem
sido o principal motor de nossa
sociedade".
"Desde 1950", desenvolve mais
adiante, "a dominação de outros
países tem sido exercida por meio
da economia (o Plano Marshall
depois da Segunda Guerra) e da
presença militar, de preferência
sutil (como a OTAN na Europa
ocidental), e politicamente por
meio de polícias secretas como a
CIA, o FBI, o DIA etc.".
Internamente, o jogo é outro.
Vidal define a política americana
como "um sistema de partido
único (com duas alas de direita,
uma chamada de democrata, outra de republicana)", financiado
pelo dinheiro das grandes corporações, que espertamente distribuem sua produção bélica pelo
maior número possível de Estados a fim de garantir a simpatia
dos deputados e senadores de cada região, leais assim a um crescente orçamento militar (previsto
para US$ 329 bilhões em 2002,
pouco menos que todo o orçamento brasileiro). Fecha-se o círculo, CQD, exulta Vidal.
O presidente democrata Harry
Truman (1945-1953) surge como
o grande arquiteto dessa estrutura e como vilão preferencial de
"The Last Empire". A seu lado,
como continuadores, Vidal elenca, surpreendentemente, John
Fitzgerald Kennedy (1961-1962),
e, sem espanto, Richard Nixon
(1969-1974), Ronald Reagan
(1981-1989), o primeiro Bush
(1989-1993) e o atual (2001). No
campo oposto, há espaço para
poucos. Jimmy Carter (1977-1981)
é solenemente desprezado, mas
Vidal exibe uma crescente admiração por Bill Clinton (1993-2001), cujo embate contra Kenneth Starr e a inquisição Lewinsky
são lidos como uma "conspiração
reacionária" contra um raro presidente que ousou uma política de
transferência, ainda que limitada,
de recursos da indústria armamentista para o campo social.
Política é a obsessão deste experiente Gore, ocupando nada menos que três das quatro partes de
"The Last Empire", mas o volume
reserva seu terço inicial para outras paixões. Vidal abre a temporada de revalorização dos romances de Sinclair Lewis (1885-1946),
defende Mark Twain (1835-1910)
da sanha "politicamente correta",
bate continência às artes de Thomas Mann (1875-1955), Anthony
Burgess (1917-1993) e do grande
poeta grego C. P. Cavafy (1863-1933) e chora a morte de Sinatra.
Entre as baixas, a mais contundente é a da reputação de John
Updike como romancista ("agarrado à facilidade"), a partir de
uma leitura devastadora de "Na
Beleza dos Lírios" (Companhia
das Letras, 1997).
Por estas e por outras que, se as
reedições de Lewis se avolumarem, críticas menos condescendentes a Updike surgirem, ataques ao mito JFK se sucederem, e
o ex-vice e provável recandidato
Al Gore, em 2004, repetir o ex-vice
e depois presidente Nixon, em
1968, ao se vingar de uma derrota
eleitoral infligida à contrapelo da
lei, todos podem culpar Vidal.
Edmund Wilson era impulsivo
e idiossincrático, mas não um polemista e jamais kamikaze. Este é
Gore Vidal, certo ou errado, homem do século 20.
"The Last Empire Essays 1992-2000"
![](http://www.uol.com.br/fsp/images/ep.gif)
Artista: Gore Vidal
Lançamento: Doubleday (EUA)
Quanto: US$ 27.50 (R$ 68,28)
Onde: www.livcultura.com.br
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