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4 vezes Björk
Estilo anticonvencional da islandesa chega
ao Brasil em discos que registram suas turnês
GUILHERME WERNECK
EDITOR-ADJUNTO DA ILUSTRADA
Em boa parte dos anos 90, dois
mundos paralelos e aparentemente excludentes davam forma
à rebelião da música popular.
Nos Estados Unidos, o grunge e
o rock alternativo agitavam o underground e chegavam à superfície de maneira arrasadora por
meio da música dos Pixies, do
Nirvana e do Sonic Youth.
Na Europa, o rock estava domesticado, sem futuro, e o eixo da
contestação mudava para a dance
music. As convenções da canção
eram destroçadas pela acid house,
pelo hardcore e pelo jungle.
A sensação era de que o futuro
passaria pelo fim da canção pop,
destruída pelos fluxos e refluxos
das batidas por minuto.
Hoje sabemos que a canção não
morreu e que essas duas culturas
encontraram denominadores comuns dos dois lados do Atlântico.
Mas essa primeira onda da dance
music européia transformou definitivamente a canção.
Ninguém aproveitou melhor essa libertação nem foi mais importante para subverter e, assim, salvar a canção do que a islandesa
Björk. Ela acabara de deixar para
trás o rock do Sugarcubes e era
punk o suficiente para golpear
sem piedade o conformismo.
Essa inquietação é a maior lição
dos quatro discos ao vivo que chegam agora ao Brasil, registrando
as turnês realizadas após o lançamento de seus quatro álbuns de
estúdio, "Debut" (1993), "Post"
(1995), "Homogenic" (1997) e
"Vespertine" (2001).
Lançados no final de 2003 na
caixa "Björk Live Box", eles chegam ao Brasil pela Universal desmembrados, embora sejam os
quatro registros obrigatórios.
Dois motivos tornam esses discos imprescindíveis. O primeiro é
a voz élfica de Björk, levada ao limite em suas acrobacias em torno
da melodia, que implodem a literalidade da letras e lhes dão significados transcendentais.
A cantora lapida um estilo anticonvencional em um momento
em que não havia perspectiva de
surgimento de uma voz que conseguisse trazer originalidade pop.
Isso porque o horizonte estava
encoberto por cantoras que primavam pela diluição, ou por se
moldarem a modelos passadistas
(as novas-velhas divas do jazz), ou
por se perderem em exercícios fúteis de virtuosismo (as empertigadas divas do R&B), ou por não
mostrarem mais que roupas sumárias (as musas do teen pop).
O segundo motivo são as conexões musicais de Björk, que aparecem de maneira brilhante dentro e fora do estúdio. Desde "Debut" e da parceria com Nellee
Hooper, produtor do Soul II Soul,
até chegar ao encontro com a vanguardista Zeena Parkins e com o
duo de eletrônica Matmos em
"Vespertine", ela foi uma antena
aberta para a modernidade.
Mas isso fez com que, desde a
primeira turnê, Björk se defrontasse com o dilema de como apresentar ao vivo discos depurados
em meses de estúdio. É aí que entra em cena a sua criatividade em
verter para o palco a essência das
canções em arranjos que se valiam da eletrônica, mas que o faziam de forma improvisada.
Para cada disco de estúdio,
Björk levava uma formação diferente aos palcos e transformava as
canções ao sabor de seus interesses musicais.
Foi assim na época de "Debut",
quando Björk ainda buscava sua
voz solo, em "Post", momento em
que desfilava sua popularidade na
cena de dance music inglesa, em
"Homogenic", quando estava em
sua fase mais expansiva e se mostrava senhora do seu nariz, e, em
"Vespertine", período em que se
volta para a introspecção, fechando um ciclo de composições.
Assim como cada um de seus
discos mostra um passo adiante,
cada uma de suas turnês reflete
essa evolução de forma diferente.
"Debut Live" registra um acústico MTV, gravado com fartura de
músicos, em que arranjos suntuosos de metais conviviam com
beats improvisados. Já nos shows
de "Post", beats pré-gravados são
usados em tempo real, em contraposição a uma bateria de jazz e
aos arranjos das cordas vertidos
para o acordeom. Em "Homogenic", um quarteto duplo de cordas se choca com beats pré-gravados. E, em "Vespertine", a harpa e
o piano de Zeena Parkins e os microbeats do Matmos travam diálogo na improvisação.
Como numa performance de
jazz, as canções são apresentadas
sempre com novos arranjos. Um
exemplo é "Anchor Song", que tinha arranjo de cordas em "Debut" e ganha três versões diferentes. As cordas viram sopros, em
"Debut Live", os sopros viram
acordeom em "Post Live", e o
acordeom volta ao arranjo de cordas, na bela versão em islandês de
"Homogenic Live".
Agora Björk se diz cansada de
músicos e quer explorar os limites
da voz em seu próximo lançamento, Medúlla, previsto para
agosto. Só nos resta esperar a próxima transgressão.
Debut Live
Post Live
Homogenic Live
Vespertine Live
![](http://www1.folha.uol.com.br/fsp/images/ep.gif)
Gravadora: Universal
Quanto: R$ 24, em média
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