São Paulo, Sábado, 28 de Agosto de 1999
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CINEMA
Diabo de Polanski se repete

HAROLDO CERAVOLO SEREZA
de Paris

O mais novo filme de Roman Polanski, "Le Neuvième Porte" (A Nona Porta), que estreou esta semana em Paris, em 24 salas da cidade, traz de volta um velho conhecido do diretor: o diabo.
Polanski, que já tratara de ocultismo em "O Bebê de Rosemary" (1968) e "A Dança dos Vampiros" (1967), entre outros, afirma não acreditar no demônio como entidade espiritual.
"Ele só me interessa como ficção cinematográfica. Eu sou muito materialista", disse em San Sebastián (Espanha), durante o festival de cinema da cidade.
Em "Le Neuvième Porte", produção hispano-francesa com Johnny Depp e Emmanuelle Seigner, Polanski adotou um discurso bastante distante do mito.
Nessa adaptação do romance "El Club Dumas", do espanhol Arturo Pérez Reverte, não se pode ter certeza de que Lúcifer existe. Para o diretor, a encarnação do anjo mau (ou bom, nunca é evidente) é a mulher, no caso, a sua própria.
Johnny Deep vive Dean Corso, um caçador de livros raros que recebe a tarefa de um colecionador chamado Boris Balkan de comprar o original de uma obra escrita no século 17.
Chamado "As Nove Portas da Sombra", trata-se de uma co-autoria de uma vítima da Inquisição com o coisa-ruim.
A odisséia começa em Nova York, onde está a edição comprada por Balkan. Logo chega à Europa, passando por Toledo (Espanha), Sintra (Portugal) e Paris (França), onde estão os outros dois exemplares.
Balkan quer encontrar o verdadeiro livro para utilizá-lo num ritual de conhecimento, invocando o dito-cujo.
Estamos diante de um enredo à "O Nome da Rosa" (romance de Umberto Eco filmado por Jean-Jacques Annaud) passado nos dias de hoje.
A chave do mistério logo se manifesta: os três livros são verdadeiros, mas nenhum conta com todas as colaborações, na forma de gravuras, do príncipe das trevas. É preciso reuni-los.
Talvez influenciados pelo sopro de confiança da recente declaração do papa João Paulo 2º, que afirmou que a luta contra o beiçudo foi vencida, os jornais franceses não pouparam críticas ao novo filme de Polanski, o primeiro realizado pelo cineasta desde "A Morte e a Donzela" (1994).
Para eles, falta-lhe a dubiedade de "O Bebê de Rosemary", em que a protagonista, vivida por Mia Farrow, acredita estar grávida do belzebu, mas tal fato pode ora apresentar-se como verossímil, ora como efeito de uma manifestação de esquizofrenia da personagem.
A história se repete como farsa. Quando Corso se infiltra num ritual satânico, é impossível não se lembrar de "A Dança dos Vampiros", mas também é claro que o efeito dessa vez é bem menos interessante.
O fato é que o mofento, como todos os nomes que o designam demonstram, é suficientemente interessante para manter a sua majestade, mesmo que Polanski, um grande diretor, não esteja nos seus melhores dias.


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