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VÍDEO LANÇAMENTOS
Duas produções que resgatam a estética da época chegam às locadoras; são 'Jackie Brown', já disponível, e 'Boogie Nights', que sai em outubro
A febre dos 70
THALES DE MENEZES
da Reportagem Local
Quentin Tarantino é, sem dúvida, um autor. Numa década em
que os diretores são cada vez mais
peças menores no tabuleiro de
Hollywood, ele consegue imprimir
uma assinatura em todos os seus
trabalhos. "Jackie Brown", sua releitura do cinema realista dos anos
70, prova a existência de um universo tarantinesco.
Os elementos recorrentes da
obra do diretor estão presentes. Os
personagens falam pelos cotovelos
e têm uma atitude cool diante da
violência e do perigo. Todos vestem roupas de gosto muito além do
duvidoso. Algumas cenas são marcadas seguindo a trilha sonora (e
não o contrário, como é comum), a
luz é bem reduzida nas tomadas
internas e o áudio é gravado com
microfones direcionais, privilegiando pequenos ruídos num nível
acima do som ambiente.
Tudo isso já estava em "Cães de
Aluguel" e "Pulp Fiction". No entanto, Tarantino fez um filme completamente diferente.
O mais incrível é perceber que
Tarantino já tem uma obra tão poderosa a ponto de permitir esse jogo de referências e comparações,
com apenas três filmes no currículo -além do episódio que dirigiu
em "Grande Hotel" e dos roteiros
que escreveu para Oliver Stone,
Tony Scott e Robert Rodriguez.
Tarantino queria um filme que
pudesse reproduzir o estilo dos cineastas americanos dos 70. Gente
como John Frankenheimer, Sidney Lumet, William Friedkin e outros adeptos de dramas policiais
realistas. Para calcar de vez o carimbo setentista na obra, resgatou
a atriz Pam Grier, esquecida figura
manjadíssima do filão de filmes de
negros, para negros e com negros
que explodiu naquela década, puxado pelo clássico "Shaft".
Tarantino evita o modo óbvio de
reverenciar os anos 70, que seria
encher a tela de tipos com sapato
plataforma e calça boca-de-sino.
Ele prefere induzir o espectador a
uma viagem nostálgica pelo som,
pelos enquadramentos e pelo ritmo do roteiro.
A trilha sonora é, como sempre
no mundo Tarantino, uma colagem de vários grupos pop obscuros, mas a referência óbvia é o som
de Lalo Schiffrin e de Isaac Hayes,
maestros dos filmes policiais há
duas décadas.
Os quadros e os cortes de imagem mostram como o diretor é um
cinéfilo enlouquecido. A cartilha
dos anos 70 é seguida fielmente.
Há dois cacoetes
constantes: o enquadramento do cenário vazio, para a posterior entrada do
ator no campo de visão do espectador, e
os planos americanos, que destoam
dos "big closes" que
infestam as telas de
cinema de hoje.
Na busca dessa estética pré-videoclipe, Tarantino apertou a tecla slow-motion. Tudo em "Jackie Brown" é lento e
distante -ou cool e
sofisticado, como
prefere o diretor.
A história de uma
aeromoça que
transporta dinheiro
de venda ilegal de
armas traz a habitual galeria de personagens bizarros: a
aeromoça (Grier),
os traficantes (Robert DeNiro e Samuel L. Jackson), a
"blondie junkie"
(Bridget Fonda), o
tira esquisitão (Michael Keaton) e o
otário de plantão
(Robert Forster).
Qualquer um poderia ser substituído. Num cinema tão
autoral quanto o de Tarantino, o
diretor domina e faz o que quiser.
Até voltar 20 anos no tempo.
Filme: Jackie Brown
Direção: Quentin Tarantino
Produção: EUA, 1997, 154 min
Com: Pam Grier, Samuel L. Jackson
Lançamento: Paris (011/3872-4404)
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