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CINEMA/"CRASH - NO LIMITE"
Ator, que já sofreu preconceitos, estrela longa de estréia do roteirista de "Menina de Ouro"
"Racismo tem a ver com poder", diz Cheadle
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao atuar pela primeira vez como produtor, em "Crash - No Limite", que estréia hoje em São
Paulo, o ator norte-americano
Don Cheadle, 40, manipula a indústria do cinema ao seu favor.
Entre uma produção milionária
e outra, como o blockbuster "Doze Homens e Outro Segredo",
com Brad Pitt e George Clooney,
Cheadle atua em filmes de caráter
mais alternativo e menos lucrativos, como este longa dirigido por
Paul Haggis, roteirista de "Menina de Ouro", e "Hotel Ruanda".
"O meu real interesse são as
produções mais autorais, mais
próximas do coração do criador.
"Onze Homens e Um Segredo",
por exemplo, fiz mais pela diversão", afirma Cheadle, em entrevista à Folha. "Esses filmes grandes são necessários porque rendem um bom dinheiro, o que me
permite fazer coisas mais alternativas, já que estes não rendem
muito nas bilheterias." Com as
contas em dia, o ator partiu para
este "Crash". "É um roteiro que lida com temas que raramente vejo
retratados em Hollywood", diz.
Na tradição de "Short Cuts", de
Robert Altman, "Crash" acompanha várias tramas paralelas que
em determinado momento irão
se cruzar. Como o título sugere, o
termo mais exato seria "esbarrar"
ou "colidir". É assim nas 36 horas
de vida dos personagens deste filme, que capta uma Los Angeles
em ebulição, habitada por negros,
brancos, latinos, asiáticos e iranianos, com tensões raciais sempre prestes a explodir.
Cheadle interpreta o detetive
Graham Waters, homem que tem
um caso com sua parceira de trabalho, latina, e que dá poucos ouvidos à mãe, que lhe pede para localizar o seu outro filho, desaparecido. "Ele é um cara que se desconectou de suas emoções há
muito tempo. Não me identifico
nem um pouco com ele."
Cheadle acredita que "Crash"
não lida apenas com a questão das
diferenças raciais e que os conflitos são causados por fatores
maiores. "O termo "racismo" tem
a ver com poder, mas não são todos que têm poder. Todos têm
opiniões sobre as outras pessoas
baseadas em preconceitos diversos, além da cor da pele, e essa é a
questão do filme."
Feito antes de "Hotel Ruanda",
sobre o genocídio no país africano
em 1994, "Crash" pode sugerir
que Cheadle prega uma espécie de
militância política com seus filmes "menores". "Claro que já fui
vítima de racismo por ser um homem negro. São incidentes pequenos que passei com policiais,
donos de lojas etc. Minhas histórias como vítima não são únicas",
afirma. "Apesar dos temas de
meus filmes, não acho que todos
em Hollywood devem ter essa responsabilidade de se tornar politicamente ativos. Mas, uma vez celebridade, é mais benéfico para a
humanidade -e para você mesmo- que você utilize os canais
de expressão disponíveis para expressar as coisas que você acredita
serem as corretas."
Assim como a visão de "Crash",
que analisa os vários lados da intolerância racial, Cheadle procura
relativizar questões polêmicas,
como o suposto descaso das autoridades americanas em relação ao
resgate das vítimas negras do furacão Katrina no sul dos EUA, em
agosto. "Não havia apenas negros
por ali mas também muita gente
pobre e branca. É nesses momentos que a questão racial se mistura
à questão social. Foi muito mais
uma questão de descaso em relação às pessoas pobres, e não em
relação aos negros. O fato é que os
Estados Unidos têm um passado
escravocrata, e até hoje nós, norte-americanos, sentimos uma culpa enorme em relação a isso."
(BRUNO YUTAKA SAITO)
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