|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TEATRO
Peça escrita e dirigida pelo brasileiro residente na Itália Maurício Paroni de Castro tem apresentações hoje e amanhã
"Pantagruele' mistura Rabelais com Oswald
NELSON DE SÁ
da Reportagem Local
Maurício Paroni de Castro, 37,
deixou o Brasil há mais de uma década para dirigir teatro na Itália.
Mas está sempre de volta para dirigir aqui -como fez em 92, com
"Típico Romântico", e em 96, com
"Náufrago", entre outras peças.
Também traz os espetáculos que
produz na Europa, como "Lettere
alla Fidanzata", com textos de Fernando Pessoa, e agora "Pantagruele, Panurgo e la Canga", que faz
apenas duas apresentações em São
Paulo, hoje e amanhã.
Em italiano e português, a montagem estreou há dois anos em Milão, no prestigioso Centro di Ricerca per il Teatro, CRT, e fez longa
turnê pela Itália.
Inspirada no satirista francês Rabelais (1490-1553) e em Oswald de
Andrade (1890-1954), cujo "Manifesto Antropófago" é lido no espetáculo, contrapõe duas "seitas": os
que fazem ofertas à memória de
Pantagruel, à memória do gosto, e
os que adoram a TV.
Folha - A peça se baseia no clássico "Gargantua e Pantagruel", mas
vê o texto à luz do "Manifesto Antropófago". Como foi a recepção
disso pelo público italiano?
Maurício Paroni de Castro - Excetuando alguns intelectuais, o italiano nem conhecia o "Manifesto",
mas no geral viu como apropriado,
porque é muito parecido com a
obra de Rabelais. A peça foi feita
em função de uma tensão social
que existe na Europa, com os novos emigrados, que estão criando
um novo mundo. Foi um sucesso
popular e alguns críticos adoraram, mas, por exemplo, um da revista "Família Cristã", de lá, achou
que eu estava preconizando canibalismo. Quer dizer, houve alguma
ignorância, mas também uma ótima acolhida.
Folha - O que a "Família Cristã"
escreveu sobre o "Manifesto"?
Castro - O cara escreveu que eu
pregava que o homem devia deglutir o seu semelhante, na letra (ri).
Eu botei, no programa, o "ano da
deglutição do bispo Sardinha", e o
cara se queimou (ri).
Folha - Qual é a ponte que você
faz entre Oswald e Rabelais?
Castro - A ponte é a crítica à cultura dos "mass media". A crítica à
remoção do próprio sofrimento e à
colocação, sobre o vazio da remoção desse sofrimento, do consumismo. Isso já escrevia o Oswald, e
o Rabelais também. O homem estava saindo do obscurantismo medieval e sonhava em poder comer,
viver feliz, mas a sociedade industrial ocidental transformou isso
em consumismo.
Folha - Qual é a sua relação com
o CRT, depois de dez anos?
Castro - Uma vez por ano eu faço
uma peça. Agora tem o projeto de
"Cândido", de Voltaire. Eu acredito que o Eldorado, da mesma forma como neste "Pantagruele", se
encontra na praça da Sé. Quer dizer, é decadente, é a decadência do
projeto iluminista, na sociedade de
consumo.
Folha - Até pelo sotaque, nota-se
o quanto você já está estabelecido
na Itália. Mas não perde a sua ligação com o Brasil.
Castro - Não perco.
Folha - Esta peça e "Lettere alla
Fidanzata", antes, são maneiras de
expressar essa ligação?
Castro - Eu, até fisicamente, sou a
mistura das duas culturas. Tudo o
que sai da minha boca, como o sotaque, é naturalmente assim. Meu
trabalho artístico é esse, elaborar
essa consciência européia e brasileira. Por isso eu me identifico tanto com esta peça.
Folha - E o "Manifesto" cabe bem
nessa elaboração.
Castro - Lógico. Aliás, a gente
não pode esquecer que isso tudo, o
"Manifesto", o modernismo, teve
a influência do Marinetti.
²
Peça: Pantagruele, Panurgo e la Canga
Texto: Michella Marelli, Maurício Paroni de
Castro e Claudia Botta
Direção: Maurício Paroni de Castro
Com: Gaetano D'Amico, Paola Baldini e
outros
Quando: hoje e amanhã, às 21h
Onde: teatro Paulo Autran (av. João Dias,
2.046, Santo Amaro, zona sul, tel. 011/523-0099)
Quanto: R$ 15. Estac. com manob. (R$ 5)
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|